Kalina Paiva

19/01/2024 08h54

 

Escola pública nota 1000

 

Instituído desde 1998, o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) não é apenas uma prova, através da qual o estudante ingressará nas universidades do país, é principalmente um instrumento balizador (no inconsciente coletivo) que confere aos estudantes e às Instituições que os preparam um status perante a sociedade.

Mesmo que uma professora com 25 anos de profissão diga nesta coluna que existem outras formas (igualmente importantes) de avaliar o conhecimento, a sociedade continuará enxergando o Enem como o maior instrumento de avaliação. E quando falamos da redação que exige domínio da língua, os estudantes nota 1000 se transformam em vitrines das Instituições. Suas cabeças são medidas a peso de ouro, ainda mais considerando que, no último teste de leitura divulgado em dezembro do ano passado, o Brasil ficou entre os piores países que apresentaram um pífio desempenho em leitura e escrita.

No caso das instituições privadas, há um objetivo certeiro na necessidade de se divulgar o êxito dos seus alunos: aumentar o número de matrículas. Diante disso e já contrariando o silenciamento das instituições públicas, também é necessário manifestar seus resultados, tanto como uma prestação de contas à sociedade quanto à memória ante os futuros momentos tenebrosos de ataque à escola pública (a História da educação pública brasileira é feita de ataques e pequenos respiros de investimentos), ainda mais quando o Inep comete falhas no momento de divulgação do resultado por unidade federativa. Esse texto é uma prestação de contas da escola pública.

No site do Inep, o Rio Grande do Norte aparece com 6 notas máximas na redação. Segundo esse veículo oficial de comunicação, foram 5 estudantes de escola privada e 1 de escola pública que alcançaram esse escore. Como o resultado não é divulgado para toda a sociedade ter acesso e sim apenas na área de cada participante do certame, acabamos tirando a limpo sobre essas identidades e seus respectivos vínculos institucionais posteriormente.

Passados quatro dias do resultado oficial, das 6 notas máximas, QUATRO são de estudantes do IFRN, instituição pública, gratuita e de qualidade, os quais aproveito para parabenizar nominalmente, quebrando os protocolos da escrita por escrever, a partir de agora, em primeira pessoa, pois também faço parte desse processo:

Gabriela Larissa de Souza Gurgel – aluna do Curso Técnico Integrado em Administração / IFRN - Campus Natal-Central, a qual tive a alegria de acompanhar e preparar dentro da proposta do Ateliê de Textos Acadêmicos, junto com a estagiária do curso de Letras da UFRN, Carolina Medeiros. Instagram da aluna: @gabilarissasg

Natália Ludimila Silva de Araújo - Curso Técnico Integrado em Alimentos / IFRN - Campus Currais Novos. Instagram: @nataliaraujo_s

João Pedro Marinho de Oliveira - Curso Técnico Integrado em Eletrotécnica / IFRN - Campus Caicó. Vale mencionar que é um jovem, filhos de agricultores. Instagram: @jpemrnh

Marliany Livia Gomes Soares - Curso Técnico Integrado em Edificações / IFRN - Campus Natal-Central. Instagram: @marlianylivia

Perguntar não ofende: quantas instituições públicas federais ficaram de fora desses dados oficiais pelo erro do Inep? Enquanto você pensa sobre isso, vamos ao território do Quarto Poder, a mídia, dar aquela espiadinha.

Embora boa parte da grande mídia sustente uma disparidade de notas, dando o devido protagonismo à Rede Privada de Ensino que, inclusive, paga para que seus estudantes apareçam estampados no merchandising dos jornais, e os cursinhos peguem carona e se beneficiem do toda uma base dos nota mil do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte, conhecido pelo trabalho integrado que desenvolve, seremos voz e resistência contra uma educação bancária e nada libertadora.

O IFRN não tem por foco o concurso em si, mas a missão social que carrega é suficiente para desenhar os pilares fundamentais da educação em que acredita, à medida que oportuniza condições de igualdade aos alunos (O filho de agricultores já citado enfrentava 100km todos os dias para estar na escola) nesse mundo regido sob a lógica do capital que exalta a meritocracia.

Somos a prova cabal de que a escola pública transforma realidades. Para isso, basta receber investimentos. Preparamos estudantes para a vida (que tem lá seus concursos) e continuaremos entregando à sociedade resultados dos investimentos. Acreditem na escola pública. Os resultados são reais.

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Sobre mim:

Kalina Paiva, professora, pesquisadora, escritora e produtora cultural.

Natural de Natal-RN, é professora do IFRN, pesquisadora em Literatura Comparada e mídias e escritora de poesia e contos. Líder do Núcleo de Pesquisa em Ensino, Linguagens, Literatura e Mídias (NUPELLM) do IFRN e membro do Núcleo Câmara Cascudo de Estudos Norte-rio-grandenses. Membro da União Brasileira dos Escritores - Seção Rio Grande do Norte (UBE/RN), da Sociedade dos Poetas Vivos e Afins do RN (SPVA), do Mulherio das Letras Nísia Floresta, e da Associação Literária e Artística de Mulheres Potiguares (ALAMP); Coordenadora de Letras e Literatura do Movimenta Mulheres RN.

 


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