Bia Crispim

21/04/2023 14h04

 

Onde estão os piolhos?

 

Havia uma época em que a preocupação que os pais tinham em mandar as/os filhas/os para a escola era a infestação de piolhos. Sim! PI-O-LHOS!

Bastava uma cabecinha cheia de lêndeas para que toda a classe voltasse pra casa se coçando. Escabin, Neocid (depois busquem no Google pra saber mais sobre essas preciosidades da medicina popular e do horror infantil), além do pente fino eram os remédios usados, fora as alquimias caseiras que só a tradição fitoterápica nordestina conhece.

Fora as lêndeas e os piolhos adultos, nós, crianças, não tínhamos muito mais na cabeça. Pensávamos em voltar pra casa, em brincar na rua, em andar pelo mato inventando caçadas, trilhas e piqueniques.

Meio Peter Pans, pensávamos em ser criança, eternamente criança. Ninguém falava em futuro, em perspectivas, em sermos grandes. O que era ser grande? Longe demais pra gente pensar. Nas férias íamos para sítios, praias; no carnaval, nos fantasiávamos e festejávamos nas ruas, vendo os bloquinhos, ou nos clubes, dançando em círculos, jogando serpentina e confetes.

Participávamos da coroação de Maria, brincávamos na praça da cidade, comíamos pipoca quentinha. Em junho, as festas juninas tomavam conta do nosso imaginário, sobretudo com a euforia dos fogos, das fogueiras, das quadrilhas, das comidas de milho... Na cidade onde nasci, essas festas se emendavam com a vaquejada, as férias de meio de ano, e a festa da padroeira Sant’Ana... Nessa época, andava nas nossas cabeças um parque: roda-gigante, algodão-doce, canoão... Eita, que nostalgia!

Quanto aos piolhos... Eles sempre voltavam. Pegávamos na escola, durante o recreio, correndo nos pátios e quadras. Piolhos se transferiam nas ruas também, de uma cabeça pra outra durante as brincadeiras de roda, nas brincadeiras de pega-pega, de esconde-esconde. E, de novo, remédios (venenos, na verdade) e pente fino. Os meus eram loirinhos como fui na infância. Difíceis de serem caçados e mortos à unha.

Mas o que não saía das nossas cabeças era nossa infância de bichos soltos. Aguardávamos os feriados, as férias de fim de ano e as festividades natalinas com uma ânsia feliz.

É uma pena que hoje a preocupação dos pais em mandar seus/suas filhos/as para a escola não seja mais com os piolhos que poderão trazer nos cabelos. É uma pena que o que anda na cabeça da criançada seja mais danoso e perigoso que aquelas infestações parasitárias. É uma pena que aos 13 ou 14 anos as crianças de hoje não queiram mais ser crianças. Ao contrário de nós, hoje tios e tias, pais e mães, avós e avôs, meio Peter Pans piolhentos que não queriam amadurecer jamais.

Escrevendo essa coluna nostálgica, voltei a ser criança. E coçando a cabeça, senti saudades dos piolhos. Benditos piolhos que sinalizavam que nossa infância poderia ser eterna.

 
*ESTE CONTEÚDO É INDEPENDENTE E A RESPONSABILIDADE É DO SEU AUTOR (A).

*ESTE CONTEÚDO É INDEPENDENTE E A RESPONSABILIDADE É DO SEU AUTOR (A).