Bia Crispim

29/07/2022 09h04

 

“NÃO É TODO HOMEM, MAS É SEMPRE UM HOMEM”

 

Há algum tempo estou querendo escrever sobre o tema que elenco na coluna de hoje, mas, por uma questão de saúde mental, venho fazendo um exercício de, primeiramente, tentar processar os fatos e notícias que me impactam ou que me ferem ou que não me atravessam de forma positiva, para só depois, sem o fervor e a indignação iniciais, textualizá-los.
 
Pois bem... Chegou até mim, no comecinho desse mês um vídeo da atriz e comunicadora Babi Amaral em que ela lança a frase que dá título a essa coluna. (Essa frase pertence, na verdade, ao poema da artista visual e fotógrafa Tracy Figg, que viralizou nas redes sociais depois de vir à tona o episódio do estuprador médico Giovanni Quintella Bezerra, que estuprou a paciente sedada após o parto. Porém, foi através do vídeo de Amaral que tomei conhecimento do texto de Figg e consequentemente, dessa máxima. – Créditos para as duas, então.)
 
Antes de discutirmos o assunto “violência de gênero”, eu acho justíssimo que você, leitor/a/e conheça o texto de Tracy:
 
“No necrotério depois de mortas. 
Com meses de vida. 
Na infância. 
Na pré-adolescência. 
Na adolescência.
Adultas. 
Idosas. 
NO PARTO. 
Nas clínicas psiquiátricas. 
Nas consultas médicas de qualquer especialidade. 
Na rua, na igreja e em casa. 
 
Pelo pai, pelo padrasto, pelo avô, pelo tio, pelo professor, pelo padre, pelo pastor, pelo médium, pelo MÉDICO, pelo marido, pelo primo, pelo irmão. 
 
Nem todo homem, mas sempre um homem.”
 
Não tenho ideia de como essas palavras chegam até você, mas imagino que, sobretudo, se você que nos lê nesse momento for uma mulher (cis ou Trans), elas vêm impregnadas de medos, traumas, ameaças, memórias ruins, indignação, revoltas, nojo, inquietações, tremores, sentimento de impotência... sei lá... Tomo a mim como referência, mas não posso mensurar o tamanho do impacto delas em cada um/a/e de vocês. Compartilho meu abraço, minha presença e meu acolhimento.
 
Depois desse episódio grotesco e depois de ver o texto de Tracy lido por Babi no vídeo publicado em sua conta do Instagram (@babi_amaral), o que despertou em mim foram as seguintes questões: 
 
Até que ponto o machismo, o sexismo, o patriarcado se sente tão à vontade para praticar violências de gênero (quaisquer que sejam elas, do xingamento ao feminicídio, passando pelos abusos e pelas ameaças...) de formas tão descaradas, tão repressivas, tão permissivas, tão invasivas, tão naturalizadas?
 
Como podemos normatizar essas práticas? Como a sociedade pode passar pano sobre essas questões com desculpas do tipo: “homem é assim mesmo”?
 
O que é um corpo feminino, o que é uma identidade feminina, o que é uma mulher (cis /Trans) aos olhos do “macho” escroto violador e “todo poderoso”?
 
Não temos idade, podemos estar mortas ou sem consciência, dentro de casa ou na rua, pelos que amamos ou por anônimos, somos violadas cotidianamente, paulatinamente, reiteradamente, continuamente, vezes e vezes seguidas, todos os dias e desde sempre tudo isso “pareceu normal”. Aos olhos de quem? Quem impôs essa “verdade”? Quem a mantém? Quem a perpetua e não permite mudanças? 
 
Está mais que na hora de desmentir essa falsa verdade. Está mais que na hora de balançarmos os alicerces desse sistema opressor. Está mais que na hora de darmos um basta a toda essa violência de gênero. Precisaremos lutar. Apesar de parecer utópico. (Mas quem de vocês um dia pensou em estar lendo uma coluna escrita por uma travesti? – Utopias são alimentos para as revoluções – mesmo que mínimas). Sei, sabemos, que não será fácil, mas não podemos mais cruzar os braços diante de tanta barbárie.
 
Mulheres do mundo, uni-vos! E que todos os homens que se sentem feridos também diante desses fatos e notícias, que sejam aliados dessa luta. Afinal, NÃO É TODO HOMEM que alimenta esse tipo de violência, MAS, infelizmente, É SEMPRE UM HOMEM e algumas mulheres (Pasmem!). Uma revolução de gênero (e suas implicações) precisa ser feita e ela precisa começar ontem. Que nossas utopias alimentem nossos sonhos de liberdade. 
 
À LUTA, COMPANHEIRAS!
 

*ESTE CONTEÚDO É INDEPENDENTE E A RESPONSABILIDADE É DO SEU AUTOR (A).