Daniel Costa

24/08/2018 08h56

Ainda na década de 60, o historiador Eric Hobsbawm escreveu ser tarefa das mais ingratas tentar transportar o modelo da democracia liberal ocidental para os países da America Latina. Na sua visão, as ideias e instituições francesas e britânicas se tornaram, nesses países, um método de enriquecer os que já eram ricos, fortalecendo os que já eram fortes. O liberalismo assim era transformado em pura retórica.  

Também em determinados países do continente europeu a democracia liberal nunca entrou muito bem em funcionamento. A Rússia é um exemplo dessa constatação. O próprio Vladmir Putin, ao se referir à tentativa dos Estados Unidos de impor os seus ideais em outras regiões do globo, já teve a oportunidade de dizer que o fato de um modelo de democracia supostamente funcionar em determinado lugar, não quer dizer que ele poderá dar certo em toda e qualquer sociedade.

Essa parece ser também a realidade dos países situados nas proximidades do mar mediterrâneo. Talvez por isso, as ditaduras sempre estiveram presentes por lá. Os tempos de estabilidade nunca foram longos. E a par das complexas questões que envolvem a harmonia institucional nessa região, não dá para colocar somente na conta das disputas econômicas e ideológicas a persistência com que os países do Oriente Médio pulam de um regime autoritário para outro. Uma certa ideia de que viver sob a vigilância do cassetete traz estabilidade pode também servir de justificativa.  

Em 2016, o Brasil encerrou o seu mais longo período de equilíbrio institucional. Foram quase 30 anos até o desfecho da maquinação do impeachment que derrubou a ex-presidenta Dilma Roussef. Hoje em dia, ninguém com a sanidade de uma criança pode fechar os olhos para a instabilidade que tomou conta dos três poderes. Tal fato, em conjunto com o sem número de pessoas desejosas do retorno dos militares, espelham a cor das tintas do momento atual, formando o panorama desolador que carcome as entranhas da democracia tupiniquim.

Esse anseio de setores da sociedade brasileira por uma forma de exercício de poder diversa da democracia liberal, certamente tem várias razões. Mas ninguém duvide que uma delas se dá em razão de o país ter se desenvolvido dentro de sucessivos regimes autoritários, gerando uma cultura da ditadura. Os brasileiros parecem sofrer de uma inaptidão para viver sob os ditames democráticos. É uma espécie de desejo de autoritarismo, que só encontra resistência quando os assassinatos de gente conhecida, praticados pelo próprio poder público, começam a transpor os muros que bloqueiam o direito fundamental à informação.


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