Prof. Aderson Freitas Barros

02/05/2016 23h09

Em tempo de crise econômica e processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff em trâmite no Congresso Nacional, os Estados Unidos e nações européias têm agido com cautela na busca de investimentos no País. O mesmo não se pode dizer dos chineses, que estão ávidos por oportunidades de negócios no Brasil.

Foi o que o JOTA constatou numa rodada de conversas com os responsáveis pelas chamadas “Foreign desks”, as mesas internacionais dos grandes escritórios de advocacia, em que há negociação entre advogados e investidores estrangeiros.
“A recente desvalorização da moeda brasileira e a crise econômica atravessada pelo País e pelas empresas nacionais poderia estimular uma maior procura por ativos e elevar os investimentos estrangeiros no Brasil. No entanto, a atual situação política tem funcionado como uma barreira ao avanço de determinados investimentos externos”, avalia Dominique Walter, consultora e membro da French Desk do BMA – Barbosa, Müssnich, Aragão.

A explicação para o apetite dos asiáticos é que trabalham com uma visão de longo prazo maior que de americanos e europeus, explica Guilherme Malouf, sócio da área de M&A do Machado Meyer. “Eles gostam de comprar em liquidação. Onde há crise, há chineses. Eles estão vendo oportunidade de fazer aquisição no setor que eles gostam, a preço de liquidação”, diz Malouf. O mesmo, segundo ele, foi feito pelos chineses em Portugal e em alguns países da África quando esses enfrentavam também forte crise.

“Os principais bancos chineses, por exemplo, se estabeleceram ultimamente no Brasil, em movimento contrário ao de bancos de investimento de outros países que reduziram suas atividades locais”, afirma Luiz Roberto de Assis, sócio do Levy & Salomão.

O professor Roberto Dumas Damas, do Insper, explica que é natural o crescimento chinês no país, mesmo em um momento de turbulência econômica e política. “Eles podem, sim, se preocupar, mas não o suficiente para frear os investimentos”.

Para ele, um “modelo comunista” exige crescimento econômico, e a China aposta nessa possibilidade a longo prazo. “Lá o retorno imediato importa, mas não tanto quanto a empresas privadas da Europa e EUA. Eles pensam em, no mínimo, cinco anos para ter retorno”, aponta.

Qualidade técnica e questão cultural

Na visão dos advogados, outro ponto importante em relação a procura de investimentos no Brasil é a questão cultural para facilitar os negócios.

Segundo Shin Jae Kin, sócia responsável pela área de Compliance de TozziniFreire Advogados, além da questão jurídica e de todo o conteúdo técnico necessários aos advogados, a importância da contextualização da cultura é essencial para a adaptação dos estrangeiros ao país.

“Eles sabem da necessidade de se adaptar a nossa cultura. Não existe mais o estrangeiro querer chegar e impor as condições por aqui”, diz Shin.

Malouf vai na mesma linha ao dizer que, quando um investidor estrangeiro procura um escritório brasileiro, o objetivo vai além do “ser bem atendido”, com serviço juridico de qualidade de forma com que tenha segurança jurídica no investimento.
“O investidor novo, principalmente, espera do advogado não só essa qualidade técnica, mas também que o advogado ajude a entender o universo de negócios no Brasil, o negócio jurídico, de forma que possa entender e enfrentar os desafios no dia a dia”, acrescenta.

Demandas e setores específicos

Os advogados contatados afirmam que os setores mais visados estão relacionados ao momento econômico e político pelo qual o país vivencia. O setor de infraestrutura ainda permanece muito visado, apesar da instabilidade trazida pela Operação Lava Jato.

“Há ondas de investimentos ligadas à situação política e econômica do país em questão”, aponta Shin. A advogada explica que já houve uma onda maior de europeus e americanos, passando por japoneses, coreanos, mas que o momento é de uma forte “onda” chinesa, principalmente no setor de infraestrutura.

Victor Galante, sócio do escritório Tauil & Chequer Advogados, diz que com a economia mais aquecida, muitas empresas querem entender como abrir uma subsidiária no país, o modelo de tributação e processo de emissão de visto.

“Com a atual taxa de câmbio e com tantos ativos sendo oferecidos, as demandas migraram para auditorias e análise de compliance, algo cada fez mais relevante neste momento pós operação Lava Jato”, comenta.

De acordo com Guilherme Malouf, houve fases em que setor financeiro atraia muito investimento externo.

“Como exemplo, a quantidade de bancos que se estabeleceram aqui, mas foi um movimento que mudou e muitos bancos saíram. Hoje, os setores que têm atraído atenção especial sao os de infraestrutura, embora haja um gap de projetos pela situacao politica. Estão esperando o cenario politico destravar”, comenta.

Além disso, afirma que o setor imobiliario recebeu muita atenção, assim como o agronegócio, principalmente com asiáticos. “Eles não querem só investir, mas garantir fluxo de exportação, de alimentos para seus respectivos paises. A China por exemplo, ela tem um deficit de oferta desses produtos, então busca investir para ter garantia”.

Já para Dominique, o setor de serviços tem se mostrado um importante destino para os investimentos estrangeiros no Brasil. “Destaca-se os investimentos em empresas de telecomunicações, eletricidade e gás, atividades imobiliárias, instituições financeiras, empresas de saúde e de serviços de tecnologia”.

Além disso, a advogada aponta que o interesse por algum setor específico depende também da nacionalidade do investidor estrangeiro.

“Nesse sentido, notamos um grande interesse atual de empresas chinesas em setores de infraestrutura e oil & gas, ao passo que os investimentos franceses, por exemplo, cobrem uma ampla gama de setores, destacando-se o setor de energia”, aponta. Dados do professor do Insper mostram que a China investiu 23 bilhões de dólares no setor nos últimos três anos.

Luiz Roberto de Assis citou que as maiores demandas, atualmente, tem sido nos seguintes setores: notificação ou impugnação de atos de concentração perante órgãos de defesa da concorrência brasileiros, em consequência de operações societárias internacionais com reflexo no Brasil; aquisição de sociedades brasileiras, envolvendo tanto auditorias (due diligences) quanto negociação societária e planejamento tributário; recuperação de ativos (execuções, recuperações judiciais, falências).

“Também existe grande interesse de clientes estrangeiros por assuntos de compliance, anticorrupção e prevenção à lavagem de dinheiro, pois os controladores estrangeiros estão expostos a riscos legais e de imagem em seus países de origem caso não diligenciem para que suas subsidiárias cumpram as leis locais”, afirma.

Empresas já instaladas X novos investidores

Segundo Dominique, do BMA, primeiramente, é preciso entender que existe uma diferença entre empresas, acionistas ou empresários estrangeiros já instalados no Brasil e aqueles que buscam no País uma possibilidade de expansão de suas atividades ou investimentos no exterior.

“Para os primeiros, as principais demandas variam, dentre outros, entre assessoria em negociação e celebração de contratos comerciais, aquisição ou alienação de ativos no Brasil, consultoria empresarial e em programas de compliance e participação em licitações”, diz.

Já no que diz respeito a novos investidores estrangeiros, a advogada esclarece que a busca tende a ser mais relevante no que diz respeito à aquisição de participação em sociedade brasileira, negociação de acordos com os sócios locais, consultoria para constituição e regularização de subsidiária no Brasil e assessoria para desenvolvimento de atividades em território nacional.

Diferenças e curiosidades

Shin, do TozziniFreire, também comentou sobre algumas curiosidades na relação com os estrangeiros, pois cada um possui um perfil diferente. “Temos procurado fazer reuniões para saber as características de cada um”, diz.
Por exemplo, os alemães são vistos como muito diretos e “sabem o que querem”. “Com os alemães, não se pode nunca atrasar uma call”, aponta.

Já os asiáticos são caracterizados por respeitarem a hierarquia organizacional, ou seja, a identificação de “quem é quem” torna-se essencial. “O coreano é o italiano da Ásia, bem emotivo. Já os japoneses são mais comedidos. Mas o importante é que todos eles precisam se adaptar a cultura legal”.

“Com relação à China, temos a visão de uma cultura machista, mas no ramo dos negócios, eles estão cada vez mais contemporâneos, mais sofisticados. A geração que está chegando hoje é preparada, e conhecem muito o Brasil. Vem com outra capacitação que não tinham há 5 anos. A China está se adaptando muito rapidamente”. Posted by; Guilherme Pimenta  e Luís Viviani


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