Wellington Duarte

24/10/2023 12h42

 

Gaza: como serão as crianças do futuro?

 

Não existe uma guerra que não cause transtornos nas pessoas, principalmente nas crianças. Nós, brasileiros e brasileiros, que nunca passamos por uma guerra, não temos como avaliar as consequências disso.

Não sou psiquiatra, psicólogo, psicanalista ou terapeuta. Sou apenas da área da Ciência Política e isso limita meu entendimento sobre o que escrevi no primeiro parágrafo. Mas vou me arriscar.

Vou trazer alguns exemplos do que eu acho que devem ter afetado profundamente as gerações futuras, e trago eventos mais recentes.

O primeiro foi a devastadora guerra civil que se seguiu à dissolução da Iugoslávia, ocorrida no começo dos anos 90 e que, em plena Europa, deixou 200 mil mortos. Além da violência causada pelas batalhas, a própria forma de como se desenvolveu esse conflito, com milhares de atos de barbárie, de todos os lados, trouxeram profundas sequelas na geração seguinte. Nessa guerra o mundo dito “civilizado” viu a volta dos campos de concentração e principalmente da limpeza étnica.

A segunda e talvez mais apocalíptica foi na sofrida África, ocorrida em 1994, na pequena Ruanda, que vitimou, em três semanas, quase um milhão de mortes. Esse evento, de natureza étnica, mostrou o quanto o ser humano pode ser sombrio. Jovens, velhos, crianças, doentes, mortos a facão, machados, paus e pedradas. Imagem as sequelas decorrentes desse evento, tão devastador que até hoje esse país se recente disso.

Não vou citar as dezenas de guerras que acontecem pelo mundo (são mais de trinta), mas nenhuma delas tem a longevidade da que assola a população palestina. E nos 15 dias essa guerra voltou à baila, causada por um ataque do fundamentalista Hamas, que causou mais de mil mortes entre os israelenses, e a resposta do governo sionista, que está em pleno vigor e que mostra o quanto Israel está disposto a “limpar” a “terra prometida” da presença dos palestinos.

E por que eu acho que essa guerra tem um efeito catastrófico nas populações locais? As gerações de hoje, que nunca sequer tiveram a oportunidade de sair de uma faixa de terra chamada de gaza, convivem com pelo menos três a quatro gerações que vivem em permanente guerra, afinal desde a expulsão dos seus antepassados, em 1948, são verdadeiros refugiados.

Palestinos com 56 anos de idade, nasceram sob a ocupação militar das tropas de Israel e, portanto, nunca tiveram a oportunidade de serem povos de um Estado que representasse uma nação árabe palestina. Esses trazem as marcas desse tempo. Vivem numa prisão a céu aberto, com alguns momentos de abertura, mas basicamente cercados e empurrados para a vivência de um pesadelo diário.

Mas olhemos para os mais jovens. Os adolescentes que estão vendo suas vidas serem pulverizadas por bombas gigantescas. Esses adolescentes cresceram sob o ódio, estão vivenciando o gosto da Morte e seu futuro certamente será movido por um profundo ódio mortal aos israelenses. A Morte os acompanhará de agora em diante e lhes fornecerá armas para devolver essa Morte. O círculo vicioso continua e poderá ser mais terrível.

Mas, e as crianças? As que que sobreviverem. Quase 30,0% dos mortos nos bombardeios são crianças. O que fazer com elas? O Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) está boquiaberta com a situação e pelo que a ONU não vem fazendo, a tragédia humanitária será muito pior do que imaginamos.

Voltemos às crianças. Como vocês acham que essas crianças sobreviventes crescerão? Acham que Gaza vai ser reconstruída? A julgar pela postura de Israel, essas crianças crescerão entre escombros, abandonadas e totalmente dependentes de ajuda, que virá certamente dos grupos fundamentalistas, que por bondade ou não, acolhem os vitimados da guerra e, na maioria dos casos, recebem de volta gratidão e lealdade.

Israel está, de fato, criando a próxima geração de combatentes palestinos.

*ESTE CONTEÚDO É INDEPENDENTE E A RESPONSABILIDADE É DO SEU AUTOR .


*ESTE CONTEÚDO É INDEPENDENTE E A RESPONSABILIDADE É DO SEU AUTOR (A).