Procurador Federal, membro da Academia Norte-Rio-Grandense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, da União Brasileira de Escritores no Rio Grande do Norte e da Associação Sertão Raiz Seridó.
O Papa Francisco nos trouxe esperanças. Alguma esperança sempre há de existir se soubermos buscá-la, encontrando-a em meio ao voo brincalhão das pombas e gaivotas no céu super azul do Vaticano ou nas cores dos concrises e galos-de-campina (cardeais-do-Nordeste) no Seridó.
Ele falava para os pobres e a sua voz também nos alcançava e nos elevava. Eu o vi (de longe) e ouvi (nos autofalantes), em 2018, na Praça de São Pedro. E calei, calei profundamente. Tentei capturar em fotos as imagens das gaivotas em rasantes. E me calei e parei de novo, diante da sabedoria do homem santo, que invadia, benfazeja, a minha alma.
Francisco era um dos poucos líderes sábios que nos restavam. A sua voz era e continuará sendo sagrada. Sua palavra será lembrada por mim e por todos que a ouviram, enquanto vida houver. Eu o ouvia e calava. Eu ainda o ouço. E fito o branco de paz nas suas vestes.
Naquele ano, eu o vi e ouvi em dois domingos seguidos. Nos dias atuais, as suas palavras, guardadas no nosso íntimo, elevam-se e perduram. Eu o ouço, mais e mais, e faço silêncio ao meu redor.
O Papa, dois anos depois daquela minha experiência no Vaticano, era um homem e santo solitário no centro da Praça de São Pedro, vazia e molhada. Era época de pandemia, de escuridão, medo, tristeza e mortes em série. Mas ele continuava a nos doar horizontes azuis. Vi e vejo, repetidas vezes, aqueles instantes históricos passados na TV. Certamente estão dentre as imagens mais marcantes do século XXI, até aqui.
Francisco nos mostrou o quanto é importante alimentar a fé e a coragem. Num tempo em que a distância entre as pessoas era garantia de salvação da saúde física, a proximidade da palavra e da atitude de Francisco se constituía num marco para a salvação da saúde mental e espiritual.
Francisco caminhava ali, sozinho, mas milhões olhavam para ele. Restou claro que o essencial é caminhar e crer, independentemente da definição que se tenha de fé. Ao mesmo tempo, Francisco expunha o quanto são frágeis as nossas vaidades, as nossas tão pequenas e vulgares egolatrias, que contaminam metrópoles e províncias com a mesma intensidade que um vírus terrível: “Com a tempestade, caiu a maquiagem dos estereótipos com que mascaramos o nosso ‘eu’ sempre preocupado com a própria imagem; e ficou a descoberto, uma vez mais, aquela (abençoada) pertença comum a que não nos podemos subtrair: a pertença como irmãos.”
As palavras de Francisco bastavam para a compreensão do momento que vivíamos na pandemia, mas vão além dela. Muito além. São palavras marcadas no mármore, como uma obra imorredoura de Miquelângelo. A única diferença é que Francisco gravou no mármore das nossas almas.
*ESTE CONTEÚDO É INDEPENDENTE E A RESPONSABILIDADE É DO SEU AUTOR (A).