Daniel Costa

22/05/2019 06h08
 
BOLSONARO E O TRONO DE FERRO
 
 
Game of Thrones, o seriado que atraiu a atenção do mundo inteiro, chegou ao final. Ele deveria ter terminado antes, no episódio em que o Rei da Noite foi derrotado por Arya Stark , após uma batalha que deixou muitos dos seus fãs sem dormir. Mas não foi o que aconteceu, e a série seguiu adiante para encontrar um desfecho agridoce, no estilo das novelas da Globo. Ou seja, sem muita emoção e com uma certa dose de previsibilidade.
 
Mesmo com todas as críticas que possam ser feitas, uma coisa acabou por salvar esse último momento: a mensagem deixada pelos roteiristas de que uma das características dos ditadores é a de querer impor a todos suas concepções de bem comum e de justiça. Não deixa de ser interessante, quanto ao ponto, que o seriado tenha posto à luz uma das questões que tem atormentado os quatro cantos do globo na atualidade: o avanço de governos extremistas comandados por sujeitos que fazem retórica com os princípios democráticos, aplicando-os ou estraçalhando-os de acordo com o que melhor lhes convêm.    
 
Para uma parte dos telespectadores brasileiros, nesse aspecto, o final de Game of Thrones foi de dar um nó nas tripas. Isso porque, coincidentemente, nos últimos dias, o presidente do país tem lançado mensagens que poderiam muito bem ter saído da boca de Daenerys Targaryen, a personagem que representou, no final do seriado, um ditador em potencial. No caso, Jair Bolsonaro disse que o grande problema do país é a classe política, e que o Brasil é ingovernável sem os conchavos. Para ele, portanto, só é possível administrar com um legislativo que lhe seja subserviente e que, consequentemente, compactue com a sua ideia do que venha ser o bem comum. Não por outra razão, tal como Daenerys, o presidente convocou o seu exército de Dothrakis, os cidadãos de bem, para saírem às ruas em sua defesa, sob o argumento de que “quem deve ditar os rumos do país é o povo! Assim são as democracias”. 
 
Ele só esqueceu de explicar sobre qual democracia está a se referir. Àquela em que o legislativo e o judiciário são instituições fundamentais, que controlam o executivo e, em contrapartida, se deixam controlar; ou a uma nova “democracia”, criada por ele (quem sabe a partir das ideias do filósofo Olavo de Carvalho, uma espécie de mão do rei), segundo a qual os outros poderes possuem legitimidade,  até não contrariarem os interesses do monarca? 
 
É possível que o final do “seriado brasileiro” não tenha tantos enigmas quanto em Game of Thrones. E é até mesmo crível imaginar que o spoiler já tenha sido revelado pela ex-aliada de Bolsonaro, a deputada Janaina Paschoal, que diante das mensagens veiculadas pelo presidente, colocou no seu twitter: “(...) o presidente foi eleito dentro das regras democráticas (...) Pelo amor de Deus, parem as convocações! Essas pessoas precisam de um choque de realidade. Não tem sentido quem está com o poder convocar manifestações! Raciocinem! Eu só peço o básico! Reflitam”.
 
O Daenerys Targaryen tupiniquim, parece mesmo estar a sonhar em ocupar o Trono de Ferro e libertar o povo de todo o mal. E no seu caso, o mal são o Congresso e o Judiciário, inimigos que estão a impedi-lo de cuspir em todos os brasileiros o fogo de suas ideias particulares de bondade e de justiça. 

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