Luiz Gomes

22/09/2017 11h55
O curso da história segue sob olhares do tempo, do qual somos testemunhas oculares, com sensações de frustrações e surpresas a cada dia que abrimos nossos jornais impressos ou virtuais. 
 
Se, de um lado, estamos ameaçados de uma guerra com armamentos impensáveis (bombas de hidrogênio) com dimensões mundiais sem precedentes, de outro, podemos também perceber a formação de uma sociedade nova civil mundial, com comportamentos e evoluções tão rápidas que não dá tempo para adaptações lentas.
A crise do capitalismo e suas penas para se adaptar aos tempos novos, vem causando e ampliando os distanciamentos entre o mercado capital e a dignidade e o equilíbrio social.
 
No entanto, esses fatos da história contemporânea nos colocam diante da globalização e seus efeitos nefastos na expansão do mercado em escala global. Atingidos são particularmente os trabalhadores, que tem os seus direitos sociais conquistados ao longo dos séculos XIX e XX, dizimados em nome da “modernização”.
 
Neste contexto de crises internacionais, que colocam a “culpa” no excesso de direitos sociais, estamos de fato diante de uma crise do direito do trabalho estreitamente ligada à desconstrução e com seus desdobramentos na esfera jurídica pelo esfarelamento do regramento da relação de emprego em múltiplas formas, que até ontem atípicas, de normatização das relações de trabalho. 
 
O discurso que vem sendo impregnado pela imprensa de que a Reforma Trabalhista será a redentora da crise e vai gerar milhões de empregos não se sustenta, especialmente sob o comando míope de empresários que preferem escravizar seus trabalhadores a brigar pela reforma tributária, combater a corrupção entre tantas outras diferenças necessárias a serem equalizadas.
 
O fato é que a precarização do trabalho vem com a realização de contratação por meio de formas jurídicas diversificadas e flexíveis que têm em comum alguns traços principais: a) a transferência dos riscos das atividades econômicas para trabalhadores autônomos pessoas físicas ou jurídicas (fenômeno da pejotização do trabalho); b) a possibilidade na contratação de serviços, subordinados ou autônomos no sistema de trabalho just in time (trabalho por hora); c) uma nova organização empresarial via esvaziamento de funcionários de forma a desnaturar a responsabilidade via terceirizações danosas aos trabalhadores; d) e permissão de trabalho de até 12 horas por dia com apenas meia hora de intervalo para almoço; e) a supremacia do negociado sobre o legislado, em absoluta desarmonia com os ditames constitucionais de proteção e garantias dos princípios fundamentais da república:
 
 “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político.” 
 
 ”Artigo 170 - A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios, .....VII – redução das desigualdades regionais e sociais; VIII – busca do pleno emprego;...”
 
Por outro lado, essa nova identidade e estruturação do juslaboralismo, traz a discussão acerca da base de criação do direito do trabalho e da Justiça do Trabalho, que consolidou o princípio protetor e o princípio da norma mais favorável ao trabalhador. Ora, com a nova norma, muda de paradigma e recoloca o trabalho na condição de submissão absoluta, revivendo tempos de império no Brasil. 
 
Aliás, ressurge o neoliberalismo com uma roupagem muito mais severa e depredatória dos direitos sociais, alguns afirmam que podem chamar de neofeudalismo ou revogação da Lei Áurea em curso, novo escravagismo.
Resumidamente, a Justiça não constitui mais a finalidade última do direito, ademais, a desjudicialização dos direitos do trabalho, privatizando as soluções de conflitos também faz parte da consequência da famigerada reforma trabalhista. 
 
Precisamos entender que todo discurso corrosivo para fazer passar a reforma pelo Congresso, teve como escopo a “modernização”, mas foi na verdade uma estratégia de subtrair direitos e aumentar lucros, sem qualquer preocupação com a dignidade humana e o desenvolvimento sustentável da economia e do trabalho. 
 
Foi sob o palio de que tais reduções de “custos” e desregramento das relações de trabalho facilitaria e aumentaria substancialmente as novas oportunidades de emprego e retomaria o crescimento econômico. Mas, na verdade, tudo que estamos vendo é a caminhada acentuada para a precarização extrema do trabalhador, demissões em vários setores da economia com o aumento do desemprego e da crise.
 
Para o direito do trabalho, no entanto, todo esse debate significa não somente a deslegitimação do paradigma da justiça social como base do Estado Democrático de Direito, mas, isso aprofunda a redireção do futuro da Justiça do Trabalho e a construção de um novo direito laboral mínimo, em detrimento do histórico de conquistas de elaboração dos direitos trabalhistas. Afinal, a falácia da fartura de emprego foi para assegurar a dilapidação de direitos sociais. 

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