Bia Crispim

10/06/2022 09h59

 

TEM UM HOMEM NAS MINHAS CORRENTES

 

Não sou do Axé (de àṣẹ, termo iorubá que significa "energia", "poder", "força", mas que pode indicar qualquer pessoa que cultue religiões de matriz africana ou afro-brasileira), apesar de sempre ter sido muito bem acolhida e aceita por quem é. Não cultuo nenhuma religião de matriz africana ou afro-brasileira, ou afro-ameríndia, ou de origem indígena, mas isso nunca me impediu de ter conhecimento e contato (admiração e curiosidade também) com amigos, lugares, amuletos, batuques, danças, crenças ligadas a essas religiões ou aos Orixás e/ou a outras entidades/divindades pertencentes a elas.

 

Tanto que no decorrer da minha vida, inclusive, sempre me associam, ou associaram minha personalidade a daquelas que são filhas de Oxum (em iorubá: Oṣun - é um orixá que reina sobre as águas doces, considerada a senhora da beleza, da fertilidade, do dinheiro e da sensibilidade. Intimamente associada à riqueza espiritual e material, à vaidade e à capacitação da mulher.). Houve quem me declarasse filha desta embalada por Iansã (ou Oyá em iorubá - é uma divindade do fogo, como Xangô – em iorubá: Ṣàngó –, mas também é relacionada ao elemento ar, regendo os raios; é associada à sensualidade; dos Orixás femininos é uma das mais guerreiras e imponentes.). Alguém já me disse que ciganas poderosas estavam em minhas correntes.

 

Fico extremamente feliz quando filhos/as/es de santo ou qualquer pessoa de terreiro, do candomblé ou da umbanda me lembram dessa proximidade com esses seres tão poderosamente “femininas” – a discordância aqui é proposital, a ênfase é serem ELAS. Ver minha existência entrelaçada a divindades/entidades em que a força e a resistência, o poder, a sedução e a feminilidade são tão pulsantes é uma lisonja. É uma bênção.

 

O curioso é que esses dias, uma pessoa do Axé me associou a Exu (em iorubá: Èṣù), orixá que, para os desavisados de plantão, NÃO é o demônio.   De acordo com a Wikipédia, de onde eu retirei muitas das informações que estão nessa coluna: “Exu é o orixá da comunicação e da linguagem: assim, atua como mensageiro entre os seres humanos e as divindades, (dentre outras muitas atribuições). É cultuado no continente africano pelo povo iorubá, bem como em cultos afrodescendentes, como no candomblé baiano, no tambor de mina maranhense, dentre outros.”

 

Felizmente, se tem uma coisa com a qual eu tenho minha vida entrelaçada é sim com a comunicação e com a linguagem. Sempre fui portadora de mensagens, sou professora desde os 12 anos, época em que comecei a dar aulas particulares para crianças menores que eu, naquele período da minha vida ainda tão tenra. Escrevo desde que me entendo de gente (quando criança e adolescente tinha diários), já fui apresentadora de gincanas, de rádio, de TV a cabo, atriz, bailarina, vendedora de sanduíche natural, sou professora de línguas, amante da literatura, escritora, palestrante, contadora de histórias.

 

Foi através da linguagem, das línguas, da construção de mensagem(ns) que meus caminhos todos se abriram, se encruzilharam com caminhos de tantas outras pessoas. E eis que me deparo, novamente, com a presença (ou influência) de Exu. Ainda segundo aqueles que o cultuam, é Exu também o responsável por essa abertura de caminhos, guardião das encruzilhadas, detentor da força motriz, do dinamismo, do fluxo... Vivo em fluxo, através das linguagens muitas com as quais convivo, seja em sala de aula, seja me comunicando com as pessoas em conversa aberta, seja palestrando, seja escrevendo...

 

Escrever é fluxo, falar é fluxo, comunicar-se é fluxo, fluxo é vida dinâmica, pulsante, falante, inquieta, de caminhos cruzados e entrecruzados... E de acordo com a crença iorubá, tudo vem da força e ação desse orixá. Então, teria um homem em minhas correntes? Parece que sim. Se eu sou filha de Oxum, embalada por Iansã (como já me disseram), quem vem desbravando veredas para passar essa filha de deusas é o abridor de caminhos Exu. Que Deus (o Deus que eu cultuo) permita que ele (Exu) e todas as outras divindades cultuadas sejam lá por qualquer religião, possam se encontrar nessa encruzilhada que é a minha vida para abençoar-me e proteger-me. Hoje eu sou só gratidão e recebo todas as bênçãos que os céus, os deuses e as deusas quiserem me dar.

 

LAROIÊ EXU!

 

OBS.: Apesar do título, a coluna de hoje é pra você, Ana Paula Campos. Obrigada por ser mensageira e por abrir caminhos.


 

 


*ESTE CONTEÚDO É INDEPENDENTE E A RESPONSABILIDADE É DO SEU AUTOR (A).