Wellington Duarte

11/03/2022 11h15

 

Política de preços de combustíveis da Petrobrás: para onde caminhamos?

Filas, choradeira e revolta “minimalista”. Essa é a reação dos brasileiros diante do “tarifaço” aplicado pela Petrobrás nesta quinta (10/03) e que deixou muito dono de carro de cabelo em pé, provocando uma correria patética aos postos de combustíveis, como se colocar combustível agora pudesse salvar seu bolso nos próximos dias. É a típica bobagem que os brasileiros costumam fazer, talvez para compensar sua falta de civilidade, posto que uma pancada de preços deste tamanho geraria mais do que raivas de Facebook e redes sociais.

Um taxista, conversando comigo, antes de ontem, disse que votou e votaria em Bolsonaro novamente e, quando indagado, ele disse que a “situação está ruim, mas a corrupção acabou” e que “a culpa do aumento da gasolina é culpa dos governadores, que não diminuem o ICMS”.  Imagino que esse pensamento vindo de um profissional liberal que enfrenta uma transição devastadora da sua forma de trabalhar, com a chegada dos aplicativos, e totalmente dependente do combustível, é compartilhado por quase 30,0% dos eleitores de acordo com as últimas pesquisas.

Obviamente que não podemos exigir do taxista que conheça a fundo o porquê dessa política danosa de preços da Petrobrás e muito menos dos milhões de trabalhadores que direta ou indiretamente são impactados pela política de preços dessa empresa, mas é fundamental que as pessoas que têm mais acesso à informação e sejam mais capacitadas para fazer uma análise mais próxima da realidade, denunciem o que foi feito com que essa empresa e que, agora, mostra seu lado sombrio.

Lembremos. Em outubro de 2016, poucos meses depois do Golpe que derrubou a presidenta Dilma, foi aprovada, a toque de caixa, uma mudança histórica na política de preços da Petrobrás. Foi instituída a Política de Preços Internacionais (PPI), que consiste em reajustar os preços dos combustíveis de acordo com o valor do barril de petróleo que tem a sua variação no preço internacional, cotado em dólar, ou seja, o preço dos combustíveis passou a derivar diretamente da conjuntura internacional. Mas não foi só isso. Teve muito mais.

A Política da Petrobras em diminuir a capacidade de 25% a 30% das refinarias de petróleo, subutilizando o seu funcionamento, vendendo unidades e investindo na extração e venda de óleo cru, abriu espaço para a chegada de empresas importadoras. Essa combinação criou um ambiente de pressões para que a Petrobras passasse a praticar então uma política de paridade com os preços de importação. Na prática a Petrobras se concentrou muito mais na exploração e produção e exportação de óleo cru do que no refino e na agregação de valor que o refino traz para esse conjunto de atividades.

Em dezembro de 2015, os preços dos combustíveis eram os seguintes, a preços correntes: gasolina, R$ 3,64; diesel: R$ 3,31; etanol: R$ 2,67. Em dezembro de 2017, mais de um ano depois de ter sido mudada a política de preços da Petrobrás, os preços eram os seguintes: gasolina, R$ 4,10 (+12,6%); diesel, R$ 3,46 (+4,5%); etano, R$ 2,91 (+9,0%). Lembrando que a inflação de 2017 foi de 2,9%, ou seja, a PPI já mostrava seu comportamento predatório em relação ao povo brasileiro, isto porque a “nova” Petrobrás tem como prioridade a remuneração dos acionistas (via dividendos) e sua atuação na Bolsa de Valores, o que, nesse caso, não necessariamente é algo negativo, desde que não se descartasse o papel dessa empresa no desenvolvimento da economia brasileira.

Desde janeiro de 2019, início da gestão Bolsonaro, até fevereiro deste ano, gasolina teve reajuste de 116%, ante uma inflação de 20,6% no período. No gás de cozinha, a alta foi de 100,1% %, e no diesel, de 95,5%, de acordo com dados da Petrobras analisados pelo Dieese. Portanto o governo atual simplesmente cruzou os braços e deixou a empresa à vontade, o que rendeu aos acionistas lucros milionários e, devido aos lucros da empresa, o governo da União também foi muito beneficiado via pagamento de impostos, que não chega a nenhum cidadão brasileiro que dependa da sua força de trabalho para sobreviver.

De janeiro de 2019 até fevereiro de 2022, a gasolina subiu 52,8% o diesel 63,6% e o GLP 47,8%, muito acima também do reajuste do salário-mínimo, de 21,4% no período, de acordo com a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Desde que foi implantado o PPI, em outubro de 2016, até 1º de fevereiro de 2022, o gás de cozinha na refinaria sofreu reajuste de 287,2%, face a uma inflação acumulada de 29,8%. Na gasolina, o aumento foi de 117,2% e no diesel, de 107,1%. Repassados para o consumidor final, os reajustes nos postos acumularam, no período, 81,6% na gasolina, 88,1% no diesel e 84,8% no gás de cozinha, informa o estudo.

E, antes que alguém cacareje sobre a “culpa dos governadores” é bom citar que as alíquotas do ICMS pouco mudaram ao longo dos anos. Só para se ter uma ideia, em 2014 a média da alíquota do ICMS em 2014 era de 27,6% e em 2021 era 27,6%, ou seja, a mesma alíquota, o que pulveriza essa crítica absolutamente ridícula.

O impacto desse reajuste na cadeia produtiva é devastador especialmente para os trabalhadores e mais pobres, porque afeta quase tudo que se consome. Os preços necessariamente serão alinhados, em toda a cadeia, e isso impacta, inclusive, no cotidiano dos mais de 220 milhões de brasileiros. Da grande empresa capitalista à cabelereira, os impactos serão claros e cristalinos, sendo que a cabelereira não tem como se proteger dessas altas e terá, inevitavelmente de tomar uma decisão drástica: ou aumenta seu preço de serviço, ou diminui a sua já reduzida margem de lucro.

A guerra mostrou o que é a Petrobrás hoje em dia, transformada numa empresa comercial voltada para seus acionistas e completamente descolada dos brasileiros e brasileiras. Não foi, como alardeia o Mandrião, “por causa da guerra”, um presidente que de forma patética assumiu sua inércia ao dizer que “nada pode fazer”.

Nos próximos dias e semanas, veremos como esses aumentos influenciarão no nosso país, até porque o Senado já correu atrás e criou um Fundo para diminuir os impactos desse conjunto de reajustes, além do socorro emergencial a setores que estão muito impactados pela política de preços da Petrobrás.



 


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