Fábio de Oliveira

07/03/2022 09h28

 

Plano Diretor de Natal: (bio) diversidades em riscos

As biodiversidades nas extensões geográficas entre os estuários e ecossistemas de manguezal do Potengi e Jundiaí, em Natal/RN, que fazem parte da Zona de Proteção Ambiental nº8 (ZPA8), são riquíssimas e vitais para todes nós. Mas essa zona vem sofrendo, há muito tempo, degradações constantes em diversos aspectos: ambientais; culturais e sociais. Recentemente, o Plano Diretor de Natal foi revisado pela Câmara, sem estabelecer nenhum diálogo com as comunidades. Então, retoricamente questiono: a modernidade que tanto almejam para cidade é pensada para quem?

Quem transita pelas pontes que ligam a Zona Norte de Natal às outras Zonas talvez não perceba os contrastes urbano e paisagístico. De um lado, temos uma paisagem cheia de prédios altos, concretos e quase nenhuma área verde. Do outro, uma paisagem mais natural com um manto verde do ecossistema de manguezal e raros edifícios residências à vista. Em uma breve travessia pelas pontes, é possível identificar as diferenças socioambientais de ambos os lados. 

Para uma compreensão assertiva sobre os impactos da revisão Plano Diretor, podemos começar citando a querida praia de Ponta Negra, o cartão-postal da capital. Talvez você, que costuma ir a essa praia, não tenha ciência, mas várias famílias que tinham a pesca como principal meio de subsistência foram obrigadas a se mudarem para outros locais, em virtude dos processos de verticalização e gentrificação da cidade. A taxação de altos impostos e a abertura para o mercado imobiliário estrangeiro para atuar nesse território foram suficientes para afastar, de forma coercitiva, essas populações.

Já na Zona Norte de Natal, que pertence à ameaçada ZPA8, os impactos não serão diferentes. As comunidades também passarão pelo mesmo processo de afastamento dos locais em que vivem e tiram seus sustentos para atender demandas capitalistas. A especulação imobiliária, a intensificação da invasão pela carcinicultura e outros interesses, evidenciam um pacto entre órgãos públicos e empreendimentos nacionais e internacionais .

A revisão do Plano Diretor não foi para atender comunidades tradicionais (pesqueiras, marisqueiras e periféricas), nem tampouco para estabelecer um olhar sustentável sobre elas e os locais dos quais tiram sua renda. Foi pensada para atender as demandas da burguesia local, nacional e internacional. A tomada de decisões sob um viés progressista por parte dos políticos, só fomenta a subalternidade e invisibilidade de outros modos de coexistência. Dessa forma, acentua-se cada vez mais o grau de fragilidade socioambiental dessa zona. Esse episódio nós já conhecemos e é tão colonizador hoje quanto a séculos atrás.

Com a concretização do Plano Diretor, não somente a ZPA8, mas a cidade sofrerá as consequências de um Plano absurdamente capitalista, que só visa ao lucro. O aumento do gabarito da cidade, que se refere à expansão da altura dos prédios, a diminuição, mudança do zoneamento das Zonas de Proteção Ambientais (ZPA’s) e a entrega de áreas para especulação imobiliária gerará uma série de problemas.

As decisões sobre as áreas em que essas comunidades subalternizadas vivem são realizadas sem nenhum diálogo com elas, que são colocadas cada vez às margens da sociedade. Assim como as gestões anteriores, a gestão atual do prefeito tem sido para colocar em prática o racismo ambiental que, por sua vez, é um dos tentáculos da necropolítica brasileira. 

Não podemos esquecer os nomes políticos e suas oligarquias da revisão deste mesmo plano em 2007, que inclusive, alguns destes ainda exercem cargos políticos ou seus familiares. Resumidamente, tratou-se de uma parceria entre gestões políticas e empresários para fins em comum, mas não voltadas à sociedade, que resultou na Operação Impacto. 

A união dos coletivos que lutam e representam essas comunidades é necessária para pautar e tensionar não somente as questões socioambientais das ZPA’s, mas também para visibilizar e fortalecer os distintos modos de coexistência, tornando-se, assim, um contra discurso social, político e antagônico à perspectiva de modernidade pensada pela Prefeitura de Natal/RN. Precisaremos de outra Operação Impacto?

 

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