Fábio de Oliveira

22/11/2021 09h42

 

Fiscais decoloniais e antirracistas

 

Faz algum tempo que, em diferentes locais, venho percebendo algumas discussões das quais não finalizam em um denominador comum ou em um acordo pacífico. Parece-me mais um duelo de egos e personalidades sobre quem detém mais saberes sobre ancestralidades e questões de afirmações identitárias, sejam indígenas, sejam negres. Uma corrida de saco para o título de enciclopédia humana mas sem estudos. Acredito que os decoloniais e antirracistas de plantão esqueceram-se que essa coisa de competição não é coisa de nossa natureza e só fomentam divisões.

Se ninguém nasce sabendo andar, sigamos a lógica de que também ninguém nessas terras da Pindorama nasce sabendo o que é decolonialidade e antirracismo. Em diversos momentos das nossas vidas, reproduzimos e reproduziremos por meio de falas e ações o que tanto combatemos. Afinal, crescemos e vivemos sob uma influência constante das ideologias colonizadoras, excludentes, opressoras e racistas.

Já vi parentes indígenas que nem ao menos têm aprofundamento sobre o que é decolonialidade e de rasas leituras. Equivocam-se com quase nenhuma propriedade sobre o assunto, fiscalizam quem está engatinhando e conhecendo aos poucos os processos de reconhecimentos identitários. Como se, repentinamente, nos tornássemos indígenas sem considerar as construções que são peculiares a cada pessoa. Cada um(a) com seu ritmo e tempo de compreensão de si e de descoberta sobre suas raízes. Baseio-me por mim; foi um dia desses que vim descobrir-me indígena!

Também vejo conflitos similares com nossos irmãos e irmãs negres, que simplesmente param no tempo para discutir colorismo e rotular quem é e quem não é negre, baseado em um tom retinto ou não de pele. Lembro-me de que Abdias Nascimento e Sueli Carneiro não perderam tempo pautando cores de pele negra, porque as emergências eram e são outras. Em paralelo a isso, os brancos na plateia acompanhando a falta de avanço, parado nessas discussões, e seguem nos violentando.

Enquanto as afirmações e diálogos divergentes acontecem entre indígenas e negres sobre quem é indígena, quem é negre e quem é pardo, os brancos, descaradamente se aproveitam, acessando políticas públicas e mais uma vez tomando espaços. A preocupação é mais voltada para dar carteiras intelectuais do que discutirmos pautas mais urgentes para nos fortalecermos. Sem estudos, sem leituras e sem criticidade, afogamo-nos em superficialidades sem avanços.

O resultado destes duelos são conflitos dos quais separam mais do que unificam lutas. É exatamente isso que o sistema colonizador deseja: deixamos de combater opressões para acabarmos nos oprimindo. Talvez algum dia não seja tão utópico pensar em uma união dos povos acêntricos e essas divisões cessarem. Acredito que tal união gerará transformações epistêmicas revolucionárias, libertadoras e potentes para todes nós.

 

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