Fábio de Oliveira

06/09/2021 00h01
As letras mortas das Leis 11645/08 e 10639/03:  A importância do ensino afro-indígena na Educação Básica
 
 
Abro o texto de hoje convidando a todes a darem uma olhada no livro didático de história dos seus filhes e sobrinhes, especificamente na parte que fala sobre os povos indígenas e negros. Veremos que a narrativa colonizadora ainda está prevalecendo e a história contada de uma única versão se reproduz nas salas de aula. É justamente essa narrativa que vem fazendo vítimas. Você percebe o cumprimento das Leis 11645/08 e 10693/03 no Ensino Básico brasileiro?
 
A Lei 11645/08 regulamenta a obrigatoriedade do ensino das histórias, culturas afro-brasileiras e indígenas nas salas de aula, em todos os níveis nas instituições de ensinos públicos e privados. Essa Lei visa a disseminar as culturas negras e indígenas na formação da sociedade. Mesmo existindo há alguns anos, percebemos que, na prática, há uma deficiência enorme na aplicação dessa Lei, pois não há efetividade nem formações docentes adequadas – que é o fundamental para a não reprodução de estereótipos dos nossos povos.
 
Ainda vejo livros didáticos e professores em salas de aula tratando a história da Pindorama como uma “descoberta”, como se fosse um grande feito heroico das navegações portuguesas, escondendo nas entrelinhas genocídios e explorações de recursos das nossas terras, que vêm acontecendo há mais de 521 anos. Sem falar no famigerado “Dia do Índio”; todo mês de abril as escolas fazem cocares de cartolina e pintam as crianças com tinta guache, ao som da rainha dos baixinhos.
 
No que diz respeito à Lei 10639/03, que se refere ao ensino das histórias e culturas afro-brasileiras, a história dos povos negros continua sendo engessada na condição de escravidão eterna. Professores persistem nessa única narrativa, desconsiderando toda a potência de povos que vieram do berço da humanidade, que têm, portanto, muita bagagem histórica e tradição. As lutas e as resistências do movimento negro não cessaram só porque a Lei Áurea foi assinada em 1888. Nada mudou e o sistema segue com perseguições, racismos e mortes!
 
Apesar das práticas educacionais citadas acima serem naturalizadas, há trabalhos que seguem uma construção de fortalecimentos e desconstrução desses estereótipos. Ana Paula Campos, educadora e minha esposa, faz um trabalho educacional que eu considero de muita importância e que tem feito uma diferença enorme. As Leis 11645/08 e 10639/03 têm sido componentes diários em suas aulas. Esses dias, ela confeccionou um jogo com fotos de indígenas em distintos contextos com informações sobre cada um/uma. Ao trabalhar essa abordagem, Ana Paula apresenta outras perspectivas e narrativas, além das nossas diversidades étnicas e culturais. 
 
Outros trabalhos incríveis como o dela, certamente podem estar ocorrendo, porém, o Ministério da Educação, no decorrer de todos esses anos, insiste em utilizar materiais que continuam com essa reprodução estereotipada dos nossos povos. Os estudos precisam ser constantes para buscar outras perspectivas e tensionar esses materiais, a fim de evitar a distorcida narrativa quinhentista dos livros de história, e consequentemente, e a estigmatização de nossos povos, limitando-nos a um estereótipo forjado por uma versão histórica registrada como oficial.
 
A efetivação dos dispositivos legais nas salas de aula precisa estar evidenciada e discutida por meio dos estudos étnico-raciais, entretanto, não como uma opção de conhecimentos e sim uma obrigatoriedade. A partir disto, avançaremos para uma construção social, politizada e menos racista.
 

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