Wellington Duarte

28/08/2021 16h52
 
A Encruzilhada do BraZil : civilização ou barbárie?
 
 
Um país com quase 220 milhões de habitantes terá se transformado no reino dos imbecis e ignorantes? Terá esse país sido contaminado pelo vírus do reacionarismo e, por conseguinte, mergulhado num período sombrio em que as mais estapafúrdias teorias estão disseminadas e introjetadas em grande parte da população?
 
No “reino da esculhambação”, onde as regras de civilização foram substituídas pelo grito e pelos ataques de fúria, insufladas principalmente pelo chefe de Estado e de governo desse país, vê-se o quanto os pilares da democracia representativa foram erguidos numa base frágil e passível, portanto, de serem simplesmente destruídas por uma horda ensandecida e que abraçou o caos como forma de ação política.
 
É necessário que a massa restante de estudiosos das ciências humanas se debruce sobre as raízes dessa tragédia nacional, pois é preciso identificar como esse país chegou a esse patamar tão baixo da sua história moderna. Será preciso que esses pesquisadores digam ao mundo o que aconteceu, para que a sociedade passe a limpo esse período sombrio.
 
Um país com pouca tradição democrática; sem um histórico consistente das formações partidárias; erguido sobre uma base econômica extremamente desigual; formado por uma estrutura de classes perversa, que manteve uma “elite” pouco esclarecida, no topo da pirâmide social e nunca permitiu que os princípios civilizatórios fossem universalizados; e que possibilitou a criação de um oligopólio dos meios de comunicação, concentrando a informação nas mãos de poucas famílias, podem dar pistas, embora não expliquem totalmente essa verdadeira razia reacionária.
 
Será necessário entender como essa sociedade, tão frágil e desestruturada, conseguiu evitar sua derrocada, também possibilita entendermos como estabeleceu-se uma estrutura política que, depois de ter sido destroçada pelo Golpe de 1° de abril de 1964, ressurgiu 21 anos depois sem ter tido “tempo” de revigorar-se politicamente e reproduziu, sem grandes contestações, o mesmo sistema político que  atravessou, inclusive, a Ditadura, abrindo frestas democráticas, é verdade, que 18 anos depois da redemocratização, permitisse a chegada ao poder central de uma ampla coalizão de forças, heterogêneas, e essa coalizão, liderada pelo maior partido de esquerda das Américas, aplicou um programa de governo que iniciou um processo de inclusão social de milhões de deserdados e abandonados, mas não avançou na educação política.
 
A fragilidade estampada numa educação que, embora com grandes avanços, não permitiu uma renovação cultural na sociedade e gerou, nas camadas médias, pouco civilizadas, um ressentimento crescente e um ódio indisfarçável por essa inclusão, pois parecia quebrar seu “normal”, ou seja, sem a construção de uma cultura política civilizatória, os que saíram da miséria e pobreza, se tornaram presa fácil do pensamento reacionário vindo dessas camadas médias que “compraram” a tese da “elite” de que o país teria que afastar do poder aqueles que buscavam reformar timidamente os alicerces da nossa desigualdade histórica.
 
Claro que tudo que está escrito acima são apenas recortes tímidos e sem muita pretensão, para chegarmos aonde estamos, a poucos dias de algo que não se sabe o que poderá acontecer. Imaginar que um país de 210 milhões de habitantes simplesmente parou no tempo e retrocede em todos os campos, seria impensável sete anos atrás. 
 
Experimentamos, depois de 38 anos do início da redemocratização, a sensação amarga de que tudo que foi construído de lá para cá, se desmoronou, enquanto uma parcela da sociedade acatou a tese esdrúxula de que estamos à beira de um “princípio comunista” e só um beócio desqualificado, de natureza torpe e avesso a qualquer tipo de empatia, poderá “salvar” esse país.
 
O acolhimento, por parte dessa camada, de teses absurdas, vindas de redes sociais, permite, mesmo com receio, dizer (mas não afirmar) que o fracasso da nossa civilização tem uma importante participação das estruturas religiosas, de comunicação e de segurança pública. Obviamente tendo o devido cuidado de não “universalizar” essa tríade sombria, pois me refiro a estruturas e não ao todo, ou seja, falo de segmentos desse conjunto que, por diversas razões, tornaram-se protagonistas desse discurso e prática da “política da ignorância”.
 
Enquanto o país caminha para 600 mil mortes em virtude da criminosa, agora se sabe, falta de comprometimento do governo central para com o combate a pandemia; vê sua economia desabar devido à política suicida do governo em deixar ao “mercado” ter a primazia de conduzir o desastre, o que está nos levando à maior crise social da história recente desse país; e de como suas estruturas políticas se mostraram frágeis, abrindo caminho para o pensamento nazifascista em pleno século XXI, a sociedade, fragilizada e dividida, caminha para a sua encruzilhada: civilização ou barbárie.
 

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