Fábio de Oliveira

16/08/2021 00h11
 
 
Intervenções culturais transgressoras de contextos
 
 
Não é preciso ir muito longe para perceber e identificar determinadas práticas coloniais, que cegamente elogiamos e aplaudimos no meio cultural brasileiro. Inclusive, é um hábito comum de ditos idealizadores de vários segmentos artísticos. Ainda vejo muitas pessoas ocupando espaços dos outros, tomando nossos lugares de fala e se aproveitando dos nossos contextos. As mentes colonizadoras estão muito bem como e onde estão, obrigado! É mais fácil continuar ganhando méritos em cima de grupos subalternizados ao invés de protagonizá-los e potencializá-los, não é mesmo? Para alguns soa como militância, para outros é ignorância.
 
 De boas intenções o mundo está cheio, entretanto, com um pouco de estudos e análises as máscaras caem facilmente. A resposta para várias provocações e questionamentos (culturais, étnicos, raciais, sociais, periféricos e de gêneros) não está em uma grande ideia, um roteiro, uma reportagem, uma obra concluída produzida por um olhar distanciado; a resposta está nas pessoas que vivem essas realidades cercadas por um modelo opressor de sociedade.
 
Alguém privilegiado da elite jamais saberá a realidade desses grupos e, por desconhecê-los, acabam reproduzindo realidades deturpadas. Uma pessoa branca de classe alta não possui propriedades para idealizar projetos e falar pelos nossos povos. Não somos objetos de estudos nem temáticas da indústria cultural que só visam o financeiro. Seria mais admirável se nossos povos fossem ensinados a externar suas próprias perspectivas através das artes, sem intervenções e sem serem exploradas para alimentar egos.
Vídeo nas Aldeias, um projeto que poucas pessoas conhecem, vai contra toda essa produção colonizadora. Foi idealizado e criado na década de 80 pelo indigenista e cineasta Vicent Carelli. A capacitação audiovisual para o fortalecimento político e cultural indígena é evidenciado nos trabalhos produzidos através desse projeto. Não somente como meio de afirmação étnica, mas formadora de cineastas, produtores e realizadores indígenas.
 
No site do projeto, que tem nome idêntico, é possível ter acesso a ricas e diversas informações de produções audiovisuais; todas feitas por realizadores indígenas de diversas etnias formados nesse processo. Essas obras resultam das oficinas de formação audiovisual, que compõem muitas etapas importantes, como elaboração de roteiros, captação de imagens, análises críticas e edição.
 
Não é somente apertar um botão no seu equipamento caro e desenvolver uma grande ideia, pensando na alimentação do próprio ego e no lucro. Tudo isso se anula quando não é pensado e feito coletivamente com e para as comunidades, etnias e demais grupos invisibilizados pelo sistema.
 
Se um projeto vai abordar tais grupos subalternizados, que seja protagonizando nossos povos à frente e/ou atrás das câmeras no audiovisual e no cinema, escrevendo suas histórias, subjetividades e filosofias através da literatura — a partir das suas próprias perspectivas e assim por diante! Precisamos ficar atentes acerca de quem e o que se produz sobre nós, fim de que não caiamos em arapucas culturais, que se aproveitam de nossos contextos. 
 

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