Daniel Costa

13/06/2021 00h36
 
O TRIUNFO DO NEGACIONISMO
 
 
O inferno são os outros, já dizia Sartre.E não é imprescindível viver com alguém entre quatro paredes para se chegar a essa conclusão, ainda que eu esteja trancado em casa com três pessoas vendo a lua cheia passar livre e sorridente pelo janelão da sala. Eu fico aqui pensando que não era preciso ter entrado no supermercado, que deveria ter conversado muito menos com Ivaldo, e sobretudo que necessitaria ser mais otimista e me enfronhar com o manto da fé. Afinal de contas, parece que agora sou eu e mais alguns poucos contra uma excitação coletiva. 
 
Ninguém quer mais saber de isolamento social, embora não seja lá muito prudente colocar o pescoço para fora da toca num país que já enterrou quase 500 mil pessoas. Mas a verdade sem roupa é que a roleta russa do vírus tem causado na turba ignara muito mais excitação do que medo. Só isso explica os bares de Ponta Negra estarem lotados todos os dias; o turismo semanal de amigos e de conhecidos; as imagens no instagram de um rolé na praia ou no Pico do Cabugi; e de um charuto cubano fumado no rock do Taverna Pub. 
 
Até os militantes de esquerda acharam de colocar o bloco na rua guardando no bolso as críticas feitas ao presidente da república.  Sim, e a Copa América vai mesmo acontecer por aqui, com jogadores, comissões técnicas, centenas de repórteres do mundo inteiro e o providencial, e desnecessário, aval do STF. 
 
Pensando bem, Bolsonaro tem mesmo razão. Talvez seja o caso de fazer como nos EUA, em que os cidadãos se encontram liberados do uso obrigatório de máscara e as portas das arenas esportivas já estão abertas ao grande público. O fato de mais de 170 milhões de norte-americanos terem tomado vacina parece ser apenas um detalhe, diante dessa despreocupação dos habitantes do país de Oswaldo Cruz com a Covid 19. 
 
Eu sei o quanto é difícil ficar no silêncio de um quarto quando faz sol nas praças. Mas são 478 mil caixões! Ou terá o negacionismo triunfado e todos agora acreditam que há uma supernotificação de mortes, sem a qual o Brasil estaria entre os países com o menor número de óbitos do globo? 
 
O que ainda me consola é que passar a maior parte dos dias isolado parece ser coisa muito boa, quando se pensa na possibilidade de cochilar nas acomodações de um hospital, na companhia de uma intubação orotraqueal, sentindo o cheiro do Cohiba e da espuma do chope que ficaram na barba por fazer. 
 

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