Eliade Pimentel

11/03/2021 00h06
 
Pipoqueira ou panela de fazer pipoca
 
 
Sempre tivemos pipoqueira do tipo tradicional, ou seja, uma panela de fazer pipoca, daquelas que a pessoa coloca o óleo ou a manteiga, o milho, se quiser já adianta o sal, e fica mexendo uma espécie de maçaneta que tem na tampa. Para quem ama esse lanchinho, coisa melhor não há. A pipoca fica milhões de vezes mais saborosa do que a pipoca de micro-ondas. Como eu só gosto de ter o básico em termos de eletroportáteis, dispenso a pipoqueira elétrica, pois antes de pensar duas vezes em adquirir uma, já venho da cozinha com uma tigela cheia de pipoca quentinha saindo do fogão.
 
Um dia desses, procurando a bendita pipoqueira, ouço um comentário no mínimo curioso: mamãe, uma vez aquela minha amiga ‘Fulana’ disse que isso aí é panela de fazer pipoca, e nunca foi uma pipoqueira. Olhamos uma pra outra, com ares de surpresa, e eu respondi. Ué, se a panela de fazer café se chama cafeteira, porque a panela de fazer pipoca não pode se chamar pipoqueira? Rimos bastante porque o assunto, na casa da amiga, tinha sido levado para a mãe da garota, que acatou o conceito da filha dela, não da minha. 
 
Alice me olha indignada, diante do meu assentimento, e diz: pois é, elas não sabem o que é uma pipoqueira-raiz. Ela se referia ao modo de fazer pipoca dos pipoqueiros tradicionais, que nos salvam com uma pipoquinha quentinha e amanteigada, ou açucarada, e são figuras clássicas em praças, festas públicas e parques de entretenimento. 
Nas centenas de vezes em que saímos para passear com poucos recursos, esse senhor onipresente foi a verdadeira providência divina. Caso alguém já tenha parado para olhar, ele fica mexendo algo quando seu sortimento está se acabando. É justamente a maçaneta da panela, que no caso dele, é maior e tem caráter industrial. 
 
Pois bem. Não vim até aqui para discutir modos de fazer pipoca, mas para chamar a atenção a um fato: como as coisas mudam de figura a partir do ângulo em que são vistas, por isso presenciamos muitas vezes discussões infindas. O capitalismo, a tal mola que move o mundo, nem precisa se utilizar de muitos argumentos para convencer as pessoas a gastarem grana em coisas desnecessárias, ou supérfluas. Nem mesmo a panela de fazer pipoca é insubstituível, visto que podemos usar qualquer panela que tenha tampa. 
Eu já fiz tapioca num fervedor, aquela panela altinha que tem um bico, usada normalmente para aquecer água, leite ou outro líquido qualquer. Já fiz cuscuz no prato, já cozinhei macarrão em cuscuzeira, e por aí vai. Sem falar, que mal uso ferro de passar roupa, porque estendo as roupas tudo bem esticadinhas, algumas já no próprio cabide. Porém, não me refiro apenas às coisas de cozinha. Refiro-me a um monte de coisa que o mercado faz a pessoa achar que precisa. De roupas caras, a procedimentos estéticos. Do material escolar das crianças, a celulares de última geração. 
 
Certa vez, uma pessoa olhou para mim, com um certo desdém, no meu recanto campestre onde vivo, e falou que não se via levando essa vidinha simples que eu levo, selecionando minhas peças de roupas favoritas nas sacolas de doação que chegam até mim, colhendo as frutas do quintal, correndo para pegar busão, carregando sacolas pesadas de supermercado, indo e vindo para Baía Formosa ou Pipa ou qualquer outro lugar, de transporte público, de taxi fretado, de carona. Da mesma forma, eu olhei para ela e pensei: apois, fique aí com seu luxo, tô nem aí. Quero mais é ser saudável, cheirosa e limpa. O resto, nem me importo, não me falta. 
 
Me diga, meu povo, principalmente agora, vivendo em meio a uma pandemia, quando nós vamos parar para repensar nossos hábitos? Outro dia, uma amiga me ligou e relatou sua indignação sobre o filho de uma amiga em comum, que foi criado achando que é um principezinho encantado e, mesmo tendo 18 anos, não faz nem seu próprio café da manhã. Noutra situação, a mãe de um homem adulto, também criado como príncipe das astúrias, lamentou o fato de o filho não ter iniciativas em casa. Eu, que sou bem boazinha e conheço o contexto, até respirei antes de responder, não com uma certa satisfação: como assim, achei que você tinha criado ele com essa intenção, o moço encantado que nada faz em casa para não cair o bilau. 
 
Até quem nasceu em berço de ouro está saindo do condado que veio ao mundo em busca de vida real, porque não basta ser humano, tem que ser gente! Graças às maravilhosas deusas que nos regem, tem uma serumaninha aqui em casa que está reagindo. Sim, a cada dia, tenho deixado claro que as crises existenciais são realidade para todo mundo. Algumas pessoas são mais atingidas por elas, outros menos, porém, uma das receitas para darmos uma volta por cima, e que eu aposto e confio 100%, é cada um aprender a cuidar de si. Não basta ter dinheiro, porque nem sempre você terá pessoas a lhe servir. 
 
Na vida real de quem trilha o caminho da vida simples, nem sempre a gente vai ter grana suficiente para comprar aquela pipoca do cinema, mas se a gente tiver tido condições de comprar o ingresso e de ter chegado até ali, então terá super valido à pena! Ah, quero deixar claro que estou usando uma metáfora, pois nem todo mundo tem condições de ir ao cinema. Mais uma vez, é sobre ser, e não ter. E sobre ser feliz eu entendo demais, meus caros leitores.  
 

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