Arthur Dutra

19/09/2019 09h05
 
Talvez o leitor Natalense não saiba, mas nossa cidade tem como símbolos a bandeira, o brasão, o hino e... uma flor. Seu nome científico é Turnera ulmifolia, popularmente conhecida como Xanana, e ela cresce em lugares comuns, sem qualquer charme ou cuidados especiais. Canteiros, calçadas, terrenos baldios e a sarjeta são ambientes propícios para que ela floresça. É uma rebelde que não deixa de desabrochar, mesmo diante do cenário adverso para outras plantas mais requintadas. 
 
Todos nós já topamos com uma Xanana por aí. À primeira vista, ela parece apenas um pequeno lampejo de beleza de uma rama de mato selvagem e inoportuno que brota em locais onde não foi cultivada pelas mãos hábeis de um bom jardineiro. Mas a flor símbolo de Natal é mais do que isso. Ela tem propriedades medicinais que são muito valiosas para aqueles que – como eu – precisam controlar as taxas de ácido úrico a fim de evitar a terrível gota.
 
A gota, como se sabe, é uma concentração excessiva de cristais de ácido úrico nas articulações do corpo, provocando inflamação e forte dor. Daí vem a expressão “gota serena”, que traz a ideia de excesso, tão conhecida na nossa região. Para controlar os níveis de ácido úrico no organismo, um santo remédio é justamente o chá da folha da xanana. Já tomei e atesto: funciona. Pois bem.
 
Um cidadão que sofre de gota evoca uma imagem que pode ser trazida como metáfora para a Natal dos dias de hoje, uma cidade com as engrenagens travadas, tal qual uma articulação repleta de cristais de ácido úrico, e sofrendo as terríveis dores de uma estagnação sem precedentes. O remédio, como já ensinou a medicina popular, deve ser como um bom chá de xanana. 
 
É, portanto, nas nossas raízes que está a cura dessa crise de gota que faz Natal sofrer com paralisia e dores. E que dores são essas? É daquelas que sente o cidadão que anda com dificuldade e insegurança nas calçadas estraçalhadas, onde somente a intrépida xanana consegue viver; aquela que sofre a mãe de família num longo trajeto dentro de um transporte penoso após ter sido expulsa do bairro onde sempre viveu; aquela do jovem recém formado que não tem encontrado oportunidades na sua própria terra e termina indo embora para outros estados e países, levando consigo sua inteligência e criatividade; aquela do empreendedor que, possuído por uma boa ideia, não encontra um ambiente favorável para fazê-la florescer pois, diferente da xanana, precisa de algo a mais para alcançar as alturas do sucesso; aquela do turista que chega cheio de expectativas para dias de descanso e divertimento, mas encontra praias sujas e abandonadas; aquela do pai de família que se vê sem opções de lazer para si e seus filhos numa cidade que está se fechando dentro de apartamentos, shoppings e condomínios.
 
Enfim, precisamos ser como a flor natalense e germinar numa grande lavoura, mesmo nesse cenário adverso, para dessa colheita fazermos o chá que irá quebrar os cristais que emperram nossa caminhada, destravar nossas articulações e acabar com a dor. Com as toxinas controladas, voltaremos a ter a agilidade para acelerar o passo a fim de recuperar o tempo perdido. A salvação está em nós, na simplicidade daquilo que temos à nossa vista. A hora é agora! Nem precisamos, então, ir longe. Basta olharmos para baixo, e lá estará a xanana, bela e simples a nos indicar uma boa imagem de bravura, rebeldia e cura. Basta olharmos para nós mesmos, e lá encontraremos o amor por uma cidade que pode, sim, ser destravada e curada com espírito de resistência e ousadia. 
 
E assim será!

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