Andrea Nogueira

26/10/2019 01h35
 
Espelho, espelho meu
 
 
Mulher bonita, simpática, com lindos cabelos, inteligente, competente, trabalhadora: eis uma combinação corriqueira bastante atual.
 
No mundo do trabalho, a mulher já galgou muitos espaços. Obviamente não foi sua aparência estética que a ajudou (de um modo geral, não).
 
De um jeito ou de outro, o mercado de trabalho se abriu para o feminino. Além do anseio das mulheres por uma independência financeira, as “necessidades” consumeristas das famílias foram aumentando ao longo dos anos, já não bastando o trabalho de um dos cônjuges para garantir o sustento de todos. Marido e esposa passaram a cumprir suas jornadas para viabilizarem o saldo bancário desejado para toda a família. O resultado desse conjunto de desejos, misturado a outros “temperos”: mulheres no mercado de trabalho.
 
Ocupar universos rotineiramente cheios de homens sempre foi um desafio. Mulheres advogadas, por exemplo, não existem desde sempre. Mas homens advogados existem desde os primórdios da advocacia. Assim, os ternos costumeiramente usados no mundo jurídico acabaram tornando-se roupa padronizada também para as mulheres que chegaram depois. Não que isso seja uma regra escrita, mas a exigência velada garante “credibilidade” à profissional do direito.
 
Roupas femininas tradicionais de diversas profissões foram sofrendo transformações homeopáticas: jogadoras de futebol, empresárias, políticas, dentre outras, permanecem com os looks mais representativos quando estão mais assemelhados aos looks iniciados pelos homens. E assim seguimos...
 
Algum problema com ternos femininos? Nenhum. Apenas importa frisar que outras roupas poderão dar à mulher o ar de pessoa bem sucedida ou de elegância, mas as roupas femininas assemelhadas às roupas masculinas são um verdadeiro passe para o mundo dos negócios tradicionais. 
 
Tudo isso deve conduzir-nos a uma reflexão sobre o olhar da sociedade sobre o feminino. Cabelos soltos, rosto sem maquiagem, saias rodadas, unhas coloridas e muitas outras características foram sendo abafadas pelo “socialmente correto” para uma mulher que trabalha (especialmente quando tratamos de ambiente de trabalho tradicionalmente ocupado por homens). É como se as mulheres tivessem que se despedir de alguns gostos e características para poderem enfrentar, sem maiores dificuldades, a transição do lar para os negócios. 
 
Há quem enfrente todo esse regramento velado do vestuário, mas certamente sofrem descredenciamento, mesmo que seja de forma sutil. Contudo, os enfrentamentos são necessários ao processo de reconstrução social. Quanto mais enxergarmos os detalhes, mais rápido alcançaremos a igualdade. Assim, tomando as palavras de Noel Rosa: Com que roupa que eu vou?
 
 

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