Andrezza Tavares

21/09/2018 11h23
Como você define o que é “Belo”?
 
Por: Andrezza Tavares e Diana Mendonça 
 
A imaginação é uma das facetas mais misteriosas da humanidade. O Ideal de “Beleza” é um componente desse imaginário.
 
Definir o que é belo é uma tarefa complexa. O adjetivo normalmente é empregado para algo que nos “agrada”, que aguça os sentidos, que capta o olhar. Um conceito subjetivo, visto que o que pode agradar a um não necessariamente agradará ao outro. Contudo, percebe-se que em determinados períodos as sociedades determinam uma visão do belo que é alçada à condição de ideal. Contemporaneamente, corpos sarados e esbeltos ocupam este espaço privilegiado e tudo que não corresponde a esse padrão é considerado feio, ou, na melhor das hipóteses, exótico.
 
Sabe-se que a beleza não foi representada da mesma forma nos diferentes períodos históricos. Na Grécia antiga, por exemplo, o belo estava associado à outras qualidades não apenas visuais, mas que poderiam alegrar tanto ao olhar como à mente. Daí a resposta do oráculo de Delfos à pergunta sobre o critério de avaliação da beleza: “O mais justo é o mais belo”. Desta forma, pode-se entender que o conceito está intrinsecamente relacionado com o tempo e a história. O que é belo hoje pode não ser no futuro, assim como podemos verificar que não foi no passado.
 
A beleza representada pela figura humana tem sido uma constante na história da arte e comumente presente na produção artística de cada período. As primeiras representações humanas foram encontradas no Paleolítico Superior (40 - 30 000 até 10 - 8 000 A.C.), sobretudo no período Gravetiano (32.000 - 22.000 A.C) – que recebe esse nome graças ao sitio arqueológico francês, La Gravette, Dordonha, França.
 
Vênus do paleolítico
 
Essas representações, encontradas em diferentes lugares, e em sua maioria, femininas, foram denominadas vênus. As pequenas estatuetas possuíam características parecidas: estatuas pequenas de mulheres nuas de seios grandes, com barriga e nádegas acentuadas, e sem rosto. Para alguns pesquisadores, as imagens são associadas ao culto à sexualidade e à fertilidade. De certa forma essa interpretação apresenta uma contradição, pois para Ferrándiz (2011) essa associação se contrapõe a noção que se tem dos grupos de humanos da época.
 
Eles eram caçadores-coletores praticaram controle rigoroso da taxa de natalidade, incluindo a prática de infanticídio (especialmente feminino), para manter taxas populacionais muito baixas e assim garantir o maior controle sobre grupos humanos muito pequenos, algo essencial para garantir a mobilidade do grupo em um ambiente hostil e em condições climáticas desfavoráveis.
 
Esse dado provoca o questionamento do significado de representar essas mulheres de corpos obesos, em um período em que tal complexitude pode ser questionada como comum aos indivíduos, visto que os recursos disponíveis para sua sobrevivência eram escassos. Os corpos volumosos teriam cunho religioso, divino, representariam a fertilidade? É possível. Mas principalmente estariam nesse lugar especial e talvez esperado como modelo do que agrada ao olhar. Algo belo a ser cultuado.
 
Para Goellner (2003), o corpo é uma construção sobre a qual são conferidas diferentes marcas em diferentes tempos, espaços, conjunturas econômicas, grupos sociais, étnicos, etc. E ao longo da história o corpo, sobretudo feminino, é cultuado e exibido como deleite aos olhos alheios. Contemporaneamente o ideal feminino é um pouco diferente do ideal representados pelas vênus, mas ainda é propagado pelos meios da época como algo a ser buscado e cultuado. Uma busca rápida em qualquer site de buscas apresentará o que é belo em cada grupo social e que, de certa forma, possuem traços parecidos de uma cultura para outra, assim como as pequenas estatuetas encontradas em diferentes locais naquele período pré-histórico.
 
Assim podemos pensar a estatueta da vênus de Willendorf, ou a última capa da vogue estado unidense como representações da beleza de um corpo/ser histórico-cultural. Apesar das diferenças entre eles, os significados culturais que lhes são atribuídos em cada época ultrapassam a materialidade biológica: o corpo "low carb" ou de formas voluptuosas representam valores coletivos e individuais de cada sociedade a seu tempo. O conceito de beleza dessas representações apesar de separados por milhares de anos, se aproximam, pois, são estabelecidos pelas sociedades em seu espaço histórico- temporal.
 
Aquelas sociedades não possuíam escrita, o que dificulta o trabalho dos investigadores que inferem significados para os artefatos encontrados. Hoje, o culto ao corpo perfeito além de figurar em quase todos meios de comunicação, produzindo imagens e discursos que com o passar do tempo indicarão o pensamento de nosso tempo. Em parte, já podemos percebê-lo na corrida desenfreada pelo corpo perfeito que lota as clinicas de cirurgia plástica e as academias.
 
Nessa linha de pensamento sobre o caráter  efêmero do conceito de beleza, temos o exemplo do quadro Monalisa que representa uma mulher com uma expressão introspectiva e um pouco tímida. O seu sorriso restrito é muito sedutor, mesmo que um pouco conservador. O seu corpo representa o padrão de beleza da mulher na época de Leonardo. Este quadro é provavelmente o retrato mais famoso na história da arte, senão, o quadro mais famoso e valioso de todo o mundo.
 
 
Na idade contemporânea, a arte e os bens culturais passam a ser submetidos aos interesses do mercado, se configurando negócio como qualquer produto do capital. Com o advento da globalização, e com a sofisticação tecnológica, inclusive, por meio da ampliação da acessibilidade aos meios de comunicação, o pensamento sobre o ideal de beleza se associa a ideia da difusão de modelo único. Nesse contexto, o modo de produção capitalista, cujo objetivo é à obtenção inexorável do lucro, passa a ser o grande sistema influenciador da representação social sobre conceito do belo, do novo e do descartável, impondo os padrões estéticos que a sociedade deverá consumir.
 
O contexto da ditadura da beleza encontra nos veículos de comunicação (tv, revistas, cinema, internet, entre outros) um arsenal de peso para reforçar a reprodução da idéia de “padrão” dos valores estéticos associando às difusões das mensagens a lógica de que todos podem mudar, transformar, moldar e esculpir na direção do código cultural unilinear convencionado pelo sistema liberal. Essa ideologia que impõe a ideia-força de beleza associada a algo puramente objetivo, coloca em vulnerabilidade as identidades culturais e individuais, os sentimentos de pertença, a auto-imagem, a auto-estima, a instabilidades emocional e física.
 
Bombardeio da cidade de Guernica : PICASSO
 
A partir dos estudos sobre “comunicação e artes visuais” compreendemos que o sentido do belo na perspectiva ominilateral encontra a sua ideia-força na percepção subjetiva e única do sujeito, destacando o seu valor simbólico que é individual, dependente das suas histórias, memórias e do seu juízo subjetivo. Esse olhar horizontal para a significação do belo permite entender o seu conceito como possibilidade de contemplação, enquanto saber compósito exclusivamente do comportamento humano, como campo de desenvolvimento humano integral das pessoas e compreender a arte como uma forma específica de sentir prazer.

 


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