Andrea Nogueira

23/08/2018 10h00
O termo parece novo, mas a prática é antiga. Não é de hoje que mulheres morrem em decorrência de um relacionamento “amoroso”, vítimas do seu parceiro. Antes, o crime era tratado como simples homicídio, mas desde 2015 ficou oficialmente mais grave e ganhou nome próprio. O nome existe para chamar a atenção da sociedade para o tipo de crime e faz parte de todo o arcabouço de instrumentos para combater a violência contra mulher por ela ser mulher.
 
Não é comum encontrarmos casos semelhantes com homens. Não é corriqueiro o registro de maridos ou namorados sofrendo contínua violência sexual por parte de suas companheiras. Também não é comum registros de homens que de tanto sofrerem violência psicológica, física ou moral por parte de suas companheiras, acabaram assassinados por elas.
 
Feminicídio significa o homicídio de mulheres quando envolve menosprezo, humilhação, discriminação, violência psicológica, física ou sexual dentro de uma relação de namoro, “fica”, noivado, casamento, união estável etc. É, portanto, bem mais grave do que um homicídio, pois afeta a relação conjugal e diminui a mulher com relação ao homem.
 
Na contramão de algumas críticas ao termo qualificador, importa esclarecer que, independentemente do contexto cultural, a intolerância com relação a este tipo de crime ajuda, e muito, no seu combate. É uma questão de repugnância mesmo. A sociedade precisa extirpar do seu seio aqueles que matam, com base no ódio, alguém do gênero feminino.
 
O feminicídio ocorre dentro de uma relação com evidente desvantagem física, esmagamento psicológico, moral e emocional.
 
Em 2006, quando foi promulgada a Lei Maria da Penha, as pessoas começaram conversar mais sobre o tipo de violência do homem contra mulher, dentro de um relacionamento “amoroso”. Antes, o assunto não era tão bem-vindo nos ciclos sociais e ainda hoje encontra barreiras visíveis e barreiras veladas. O tema incomoda, envergonha, inquieta, causa dor, constrangimento, dúvidas. Ninguém quer o peso da responsabilidade por conviver ou simplesmente conhecer pessoas prestes a cometer um crime.
 
O feminicício não é um crime surpresa. Antes de se concretizar, outros tipos de violência já o antecederam por dias, meses ou anos. É um crime anunciado, mas as pessoas ainda não estão devidamente informadas ou interessadas no assunto.
 
Recentemente uma decisão judicial libertou um homem que protagonizou cenas fortes: ele agrediu a mulher com chutes, socos e puxões de cabelo. Segundo o juiz, “o homem não apresentava risco ao cumprimento da lei”...
 
Em 2013, o relatório final da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito sobre Violência contra a Mulher narrou o seguinte: “o feminicídio é a instância última de controle da mulher pelo homem: o controle da vida e da morte. Ele se expressa como afirmação irrestrita de posse, igualando a mulher a um objeto, quando cometido por parceiro ou ex-parceiro, como subjugação da intimidade e da sexualidade da mulher, por meio da violência sexual associada ao assassinato; como destruição da identidade da mulher, pela mutilação ou desfiguração do seu corpo; como aviltamento da dignidade da mulher, submetendo-a a tortura ou a tratamento cruel ou degradante”.
 
Feminicídio não é bobagem ou uma simples invenção social. Persistir ignorando-o é contribuir com uma dominação legalizada.

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