Andrea Nogueira

14/07/2018 18h31
A mulher e o tempo
 
 
Não é somente o tempo que define a mulher e sim o que ela faz nesse tempo.
 
Uma mulher moderna age de acordo com a época em que vive, acompanhando  a evolução do mercado de trabalho, de consumo, compreendendo a tecnologia e os assuntos políticos e econômicos atuais. O moderno é contemporâneo.
Olhando para a década de 50, a mulher moderna era aquela que casava e dedicava seu tempo e pensamentos para o marido. Ela se dedicava a leitura e aos afazeres domésticos. Basta ler a maioria das revistas e jornais deste período para reconhecer a mulher moderna dos anos 50.
 
Um jornal chamado Jornal das Moças, do ano 1957 publicou: “não se deve irritar o homem com ciúmes e dúvidas”. Parece brincadeira... No ano 1958, o mesmo jornal publicou: “sempre que o marido sair com os amigos e chegar altas horas da noite, espere-o linda, perfumada e dócil”. A revista Querida, no ano 1955 publicou: “o lugar de mulher é no lar. O trabalho fora de casa masculiniza”.
 
Nos anos 60, as mulheres modernas permaneceram praticamente com o mesmo conceito dos anos 50. Em 1962, a revista Cláudia publicou o seguinte: “se desconfiar da infidelidade do marido, a esposa deve redobrar os carinhos e provas de afeto, sem questioná-lo nunca”. Se note que eram sequencias as publicações domesticando a mulher em função do homem. Mas para aquela época, isso não era nada demais, porque a mulher moderna estava casada e seu maior passa tempo era a leitura de jornais e revistas (estes obviamente escritos por homens).
 
Olhando para a década de 70, percebemos que houve um crescimento da participação feminina no mercado de trabalho. Assim, mulher moderna, nesta época, era a mulher que trabalhava.
 
Na década de 80 a mulher passou a ser oficialmente estudada. Teorias e conceitos sobre o gênero começaram a surgir. A mulher moderna nessa década era aquela que questionava seus direitos, pois um considerável número já se reconhecia tão importante quanto o homem.
 
Na década de 90 (1993) a ONU reconheceu oficialmente todos os direitos das mulheres como direitos humanos. Numa conferência, recomendou que toda mulher tenha direito à vida; não seja submetida à tortura nem a tratamento cruel, desumano ou degradante; tenha igualdade na família, tenha acesso às condições de empregos justos e favoráveis, entre outros. Estabeleceu que “compete ao Estado o dever de zelar para que as leis contra a violência e maus tratos familiares, o estupro, os abusos sexuais e outros tipos de violência contra as mulheres”. Assim, a mulher moderna desse período não levava desaforo pra casa.
 
Somos rotuladas o tempo todo. E o desprendimento destes rótulos é um desafio, pois corremos o risco de nos acostumarmos com eles. Mas um outro tipo de mulher não norteia seus pensamentos ou atos apenas nas oportunidades ou realidades que o presente lhe proporciona. Ela vai além.
 
Há quarenta anos, a mulher à frente do seu tempo era aquela que fazia tricô, crochê, ponto cruz, cozinhava, cuidava do lar... e ainda trabalhava.
 
Hoje, esta mulher é aquela capaz de reconhecer que as condições e definições do presente não são o bastante para suprir os seus anseios ou desenvolver suas competências. Ela não se conforma em poder participar, ela participa. Ela não se conforma em ter seus direitos reconhecidos por uma lei. Ela faz dessas leis instrumentos de verdadeiras mudanças sociais.
A mulher moderna aproveita as oportunidades ofertadas. Mas aquela que está à frente do seu tempo cria oportunidades. A moderna age de acordo com o que esperam dela. A outra  age além do esperado e por assim nortear sua vida, provoca verdadeiras mudanças sociais, estruturais e políticas.
 
O reconhecimento legal dos direitos da mulher e evolução legislativa que lhes afeta não é fruto de luta de mulheres modernas. Devemos àquelas que sempre estiveram à frente do seu tempo, cada conquista. 
 
Um outro ponto importante: esta mulher não concorre com os homens. Não faz dos seus anseios profissionais uma arma para destruir o outro ou mostrar que é melhor que o outro. Ela simplesmente cresce, cria e transforma.

*ESTE CONTEÚDO É INDEPENDENTE E A RESPONSABILIDADE É DO SEU AUTOR (A).