Andrezza Tavares

05/07/2018 14h37

Heriberto Silva Nunes Bezerra 1

Jean Carlos Dias Ferreira 2

Andrezza Maria B. N. Tavares 3

Francinaide de Lima Silva 4

O projeto Tarralfas é respaldado pelos objetivos propostos pela direção de extensão do IFRN que valoriza os processos educativo, cultural, político, social, científico e tecnológico que promove a interação dialógica e transformadora entre as instituições e a comunidade externa, levando em consideração a territorialidade. A extensão ainda tem como diretrizes a disseminação de conhecimentos por meio de programas, projetos, cursos de extensão, internacionalização, promoção e participação em eventos para divulgação das ações institucionais, prestação de serviços à comunidade e relações com o mundo do trabalho. Essas ações devem envolver a comunidade externa e estar articuladas com o ensino e/ou pesquisa, contribuindo para o processo de formação do educando.

A proposta de extensão do IFRN está alicerçada em oito (08) áreas temáticas as quais citamos: Comunicação; Cultura; Direitos Humanos e Justiça; Educação; Meio Ambiente; Saúde; Tecnologia e Produção; Trabalho. Nosso trabalho pesquisado está inserido na área temática da Educação haja vista o processo de alfabetização freireano promovido com os participantes do projeto, situação identificada como necessidade da comunidade externa em estudo.

 

1 Autor do artigo. Graduado em Matemática pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte (2017). Mestrando pelo Programa de Pós-graduação em Educação Profissional (PPGEP) pela mesma instituição. E-mail: herinunes2010@hotmail.com.

2 Possui graduação em PEDAGOGIA pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2007). Também possui Especialização em LIBRAS. Mestrando pelo Programa de Pós-graduação em Educação Profissional (PPGEP) pela mesma instituição. Email: jeancdferreira@hotmail.com.

3 Possui graduação em Pedagogia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2003), mestrado em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2005) e doutorado em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2010). Atualmente é sócio individual da Sociedade Portuguesa de Ciências da Educação, sócio individual da Associação Nacional de Política e Administração da Educação - Sede, ancora do programa - TV Metropolitano, sócio individual - Association pour le Développement des Méthodologies d'Evaluation en Educati, sócio individual do Grupo de Estudos sobre Política Educacional e Trabalho Docente, conselheira - Cruz Vermelha e professor efetivo do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em formação de professores, atuando principalmente nos seguintes temas: educação, formação de professores, políticas educacionais, educação profissional e desenvolvimento humano. Email: Andrezza Maria Batista do Nascimento Tavares.

4 Professora de Didática do Quadro Efetivo do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte-IFRN e do Programa de Pós-Graduação em Educação Profissional/PPGEP-IFRN. Doutora pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2013), com Estágio Doutoral no Exterior/Capes na Universidade de Lisboa. Graduada em Pedagogia e Mestre em Educação pela UFRN. Atuou como Professora Substituta do DFPE/UFRN e de Didática na Universidade Estadual do Rio Grande do Norte/UERN. Colaboradora no Grupo de Pesquisa "História da Educação, Literatura e Gênero"/UFRN/CNPq e Membro do "Núcleo de Pesquisa em Formação Docente e Ensino de Física"/IFRN/CNPq. Líder do Grupo de Pesquisa "Educação, Sociedade e Tecnologia"/IFRN/CNPq. Atua principalmente na área de pesquisa Educação, Cultura e História da Educação, bem como Formação Docente para a Educação Básica e Profissional. Tem experiência na área de Educação, com ênfase em História da Educação, Didática, Psicologia da Educação, Formação Docente, atuando principalmente com os seguintes temas: educação, história da educação, formação de professores, educação profissional, alfabetização, práticas escolares e ensino-aprendizagem. Email: Francinaide de Lima Silva Nascimento.

 

As ações de extensão promovidas pelo IFRN são classificadas em sete (07) modalidades: Programas; Projetos; Cursos; Eventos; Atividades de Internacionalização; Prestação de Serviços; Visitas.

A nossa equipe de investigação realizou imersão no Projeto Tarralfas no dia 11 de junho de 2018. Fomos até o seu lócus na Praia de Pirangi do Sul onde interagimos com um grupo de pescadores e com suas esposas, estudantes de alfabetização de um projeto de extensão do IFRN – Campus Natal Central, intitulado “Vivências de Educação Freireana com pescadores de Pirangi-RN”.

No registro fotográfico, a sensação de encantamento dos pesquisadores, Heriberto Silva Nunes Bezerra e Jean Carlos Dias Ferreira, ao presenciar as tramas pedagógicas libertadoras do Projeto Tarralfas, a partir das práxis da alfabetização popular.

Figura 1: Pesquisadores em campo no Projeto Tarralfas do IFRN

Fonte: acervo do autor. (2018).

O Projeto tarralfas trata de um conjunto de atividades contínuas, desenvolvidas por um período mínimo de três (03) meses, com objetivos específicos e prazo determinado, o qual pode ser vinculado ou não a um programa, envolvendo a participação de discentes e

servidores para a sua execução. O projeto é composto por 29 membros sendo sete (07) servidores entre professores e técnicos administrativos, e vinte e dois (22) são discentes das licenciaturas de Geografia, Física e Matemática. A coordenação da ação de extensão é realizada pelo Professor Dr. José Mateus do Nascimento e acompanhado pela Servidora Técnica Administrativa, Maria Soares de Macedo, Coordenadora de Extensão do IFRN – Campus Natal Central.

Na figura 2 apresentamos o coordenador do Projeto Tarralfas, Dr. José Mateus do Nascimento. O qual, além de coordenar, atua também como educador.

Figura 2: Dr. José Mateus do Nascimento, coordenador e educador do Projeto Tarralfas.

Fonte: acervo do autor. (2018).

O projeto comumente chamado “Tarralfas” nasceu de uma necessidade de um Sargento da Marinha, Sr. César, que trabalhava com os pescadores da região e requeria um mínimo de alfabetização deles. Dessa forma, o Sr. César acionou a Coordenadora de Extensão do IFRN – Campus Natal Central a Servidora, Maria Soares de Macedo, que tomou as devidas providências para submeter o projeto. O cognome “Tarralfas” é oriundo de uma fusão entre a palavra ‘tarralfa’, um instrumento dos pescadores, e a palavra ‘alfabetização’, tarra+alfa formando “tarralfas”. O espaço das aulas também foi uma cessão da Marinha, mas adiantamos que o local é bem limitado de estrutura, arcaico, chão batido, mesas e cadeiras improvisadas, quadro branco pequeno, em dias de chuva apresenta goteiras e a claridade solar é bem forte em dias normais. Vale salientar que alguns materiais para a realização do projeto foram doados pela empresa privada “Outback” por meio de sua política de responsabilidade social.

Nossas entrevistas foram gravadas em áudio com o coordenador do projeto, com a servidora coautora da ação, com dois (02) professores alfabetizadores e com dois (02) alunos pescadores. Realizamos registros fotográficos antes, durante e posteriormente às aulas. Também realizamos algumas conversas “informais” a respeito do estilo de vida dos alunos pescadores como subsídios adicionais aos nossos registros científicos.

Por meio das falas do coordenador, dos professores alfabetizadores e dos alunos percebemos a pedagogia freireana em ação em diversos momentos. Quando o objetivo é tornar os alunos autônomos e participativos da construção do conhecimento; identificando o que já sabem (conhecimentos prévios) e utilizando este como base para novos saberes; interagindo com os docentes e com a turma de forma acessível e espontânea; valorizando suas falas e formas de aprend/er; encontrando significados no aprendizado com a vida extraclasse e resultando num legado e contribuição para a vida pessoal.

Destarte, identificamos no projeto semelhanças com os pensamentos de Paulo Freire, em especial com sua célebre obra Pedagogia da autonomia (1996). O autor infere que educar não é treinar indivíduos para o desempenho de atividades e sim criar possibilidades para que estes possam construir o conhecimento, utilizando-o à vida.

Outrossim, Freire (1996) destaca que essa atividade educativa é fruto da constante prática com os educandos, podendo ser comparada a metáfora do jovem cozinheiro, o qual inicialmente tende a cometer erros ao reproduzir uma receita. Todavia, com as falhas cometidas adquire experiências e aprimora habilidades, além disso, desenvolve seus aspectos emocionais, como confiança e autocontrole, os quais fundamentais êxito profissional.

Ainda, temos por Freire (1996, p. 23) que "desde os começos do processo, vá ficando cada vez mais claro que, embora diferentes entre si, quem forma se forma e reforma ao formar e quem é formado forma-se e forma ao ser formado". É neste sentido que compreendemos que ensinar não é transferir conhecimentos, mas uma ação em que educando e educador constroem o conhecimento, compartilham experiências por meio das atividades colaborativas e interativas.

Deste modo, expomos a seguir algumas atividades desenvolvidas pelos educadores no Projeto Tarralfas, as quais associamos a teorias freireana, pois percebemos práticas integradoras, educativas e que promoviam a forte relação entre teoria e prática, ou seja, aprendizagem relacionada com a atividade pesqueira e doméstica.

Em um espaço cedido pela Marinha, educadores e educandos dividem o ambiente com lanchas e jet skis de luxos, sem muito conforto, cadeiras e mesas de plástico, um pequeno quadro-branco e o chão molhado. É sob essas condições que pescadores e donas de casa de Pirangi buscam a apreensão do conhecimento.

Apesar, das adversidades físicas apresentadas, o esforço e a dedicação dos educadores e educandos são motivadores a aprendizagem. Percebemos em loco, que assim como Freire salientou, ocorre de fato aprendizagem a ambos. Assim, professores e colaboradores (alunos da licenciatura do IFRN/CNAT) aprendem com as experiências das donas de casa e dos pescadores, e esses aprendem com aqueles, as primeiras letras, operações básicas da matemática e em muitos dos casos, a escrever seu próprio nome.

Abaixo apresentamos a figura 3, em que é possível observar uma das atividades desenvolvidas no projeto. Essa atividade utilizou-se de palavras do cotidiano dos pescadores a fim de que esses pudessem construir em grupo a aprendizagem silábica.

Figura 3: Professor explicando atividade de construção silábica no Tarralfas.

Fonte: acervo do autor. (2018).

Por intermédio da figura 3, percebemos que o educador está mediando a atividade e suprindo aos prováveis questionamentos. Nessa atividade, os indivíduos formaram pequenos grupos, porém cada grupo continha a presença de um colaborador, o qual ajudaria aos educandos. Após a organização dos grupos, esses deveriam utilizar as sílabas, disponibilizadas pelos educadores, para formar palavras correspondentes com as receitas sugeridas pelos grupos na aula anterior.

Sendo essas: Camarão no alho e óleo, moqueca de arraia, lagosta torrada, baião de dois, lagosta assada e arraia seca. Além de formar as palavras usando as sílabas, ao final da atividade, o grupo relataria aos demais o passo a passo de como preparar um dos deliciosos pratos escolhidos. Logo, estaria assegurada a interatividade de todos os grupos e o compartilhamento da aprendizagem e da experiência.

A seguir, apresentamos a figura 4, a qual demonstra a colaboração dos educadores no processo de aprendizagem e alfabetização dos pescadores e donas de casa.

Figura 4: Colaboradores orientando durante atividade.

Fonte: acervo do autor. (2018).

Os colaboradores como já mencionamos, são alunos das licenciaturas do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte, relataram que gostam do projeto porque ele permite que pessoas que não puderam na juventude se alfabetizarem, retomem seus estudos, adquirindo assim, mais confiança e independência.

Além disso, os colaboradores complementaram que a experiência de participar do Projeto Tarralfas fomenta a sua formação docente, na medida em que, aprimoram competências pedagógicas, relacionam conceitos aprendidos em sala de aula com a realidade dos indivíduos, além de trabalharem seus aspectos emocionais, como timidez e insegurança ao falar em público.

Na figura 5, evidenciamos a prática pedagógica desenvolvida pelos educadores. Como já mencionamos tratou-se de atividade de construção silábica. Essa prática, era comumente praticada por Freire, o qual, utilizava de palavras como: enxada, tijolo, colheita e terra, para alfabetizar os sertanejos. Semelhantemente, percebemos que no Projeto Tarralfas, palavras

como: peixe, lagosta, barco e panela são corriqueiras no processo de alfabetização desses educandos.

Figura 5: Atividade com uso de sílabas à formação de palavras, como lagosta e peixe.

Fonte: acervo do autor. (2018).

Constatamos, por meio da atividade, que a curiosidade e a criatividade dos educandos estiveram ativas durante todo o processo, sendo constantemente incentivadas pelos educadores. Freire (1996) infere que é necessário criar situações via atividades que excitem a curiosidade, criatividade e o pensamento crítico, pois privar esses indivíduos desses aspectos cognitivos é amesquinhar o que há de mais belo no processo de aprendizagem dos saberes.

Logo, embasado no discurso de Paulo Freire na obra supracitada, pelas observações apreendidas em loco e relatos dos educadores e educandos percebemos a importância da relação de confiança e respeito entre esses indivíduos, de modo que, as práticas pedagógicas devem ser pensadas a fim de incentivar a criatividade e curiosidade do educando, relacionando o saber científico com as práticas do cotidiano.

Essa relação de aprendizagem significativa, encontra-se explícita na fala de um dos pescadores, o qual enfatizou que antes do projeto não sabia escrever o próprio nome, tinha dificuldades em realizar operações básicas da Matemática, necessárias em suas negociações com clientes, contudo, graças ao projeto conseguiu ter mais confiança e independência.

Assim, por meio trabalho coletivo, as práticas pedagógicas desenvolvidas no Tarralfas alcançaram seus objetivos, alfabetizar os pescadores e as donas de casa de Pirangi, permitindo que esses tornem-se sujeitos protagonistas da aprendizagem, conquistando assim maior autonomia.

Referências:

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: Saberes necessários à prática educativa. 37. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.


*ESTE CONTEÚDO É INDEPENDENTE E A RESPONSABILIDADE É DO SEU AUTOR (A).