Andrezza Tavares

04/07/2018 14h50

Raiana Marjorie Amaral de Oliveira
Andrezza Maria B. N. Tavares
Francinaide de Lima Silva

As práticas participativas são discutidas por autores como Miguel Exposito Verdejo, Lydia Kummer e Paulo Freire, educador e filósofo pernambucano, reconhecido como patrono da educação brasileira e com trabalhos com relevância internacional na área da educação. Obras como “Pedagogia do Oprimido”, “Pedagogia da Autonomia” e “Extensão ou Comunicação” apresentam o pensamento e o método “freireano”, baseado na participação popular, na valorização do saber comum e na concepção de educação libertadora e emancipatória.
Paulo Freire traz em seu método a defesa da conscientização, através de um diálogo crítico e libertador, defendendo a formação continuada. O autor tem uma crítica ao sistema neoliberal e acredita que o papel da educação é libertar o sujeito oprimido de sua condição. Trabalhando temas como a práxis e a transformação social. Paulo Freire defende que a educação proporcione o processo de humanização dos sujeitos e para ele, o sujeito só se torna humanizado quando se sente autônomo e liberto.

1 Assistente Social do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte. Mestranda pelo Programa de Pós-graduação em Educação Profissional (PPGEP) pela mesma instituição.

2 Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2010) e Professora do Quadro Efetivo do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte-IFRN e do Programa de Pós-Graduação em Educação Profissional/PPGEP-IFRN.

3 Doutora pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2013) e Professora do Quadro Efetivo do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte-IFRN e do Programa de Pós-Graduação em Educação Profissional/PPGEP-IFRN.


Foto 01: Equipe da EMATER e agricultores  


Fonte: Acervo EMATER/RN.

Inspirada pelo pensamento apresentado, a EMATER/RN – Instituto de Assistência Técnica e Extensão Rural do Rio Grande do Norte desenvolve práticas pedagógicas nas comunidades da zona rural do estado com objetivo de fomentar a produção agrícola. A ações são norteadas pelas metodologias participativas no meio rural que objetivam o desenvolvimento das potencialidades encontradas na área.
A EMATER realiza nas comunidades em que desenvolve as suas ações o Diagnóstico Rural Participativo – DRP, um conjunto de técnicas utilizadas para que a comunidade realize o seu diagnóstico, considerando seus próprios conceitos e critérios de explicação, objetivando que os participantes passem a autogerenciar o planejamento e o desenvolvimento das ações. De acordo com Exposito (2010), esta metodologia teve influência direta da educação popular inspirada na obra “Pedagogia do Oprimido” de Paulo Freire. Para Freire a educação deve buscar a compreensão e a percepção que o sujeito tem do seu lugar no mundo e o que ele representa.


Foto 02: Agricultores realizam atividades para a construção do DRP.

Fonte: Acervo EMATER/RN.

A comunidade indígena do Catu, localiza-se entre os municípios de Canguaretama e Goianinha, no Rio Grande do Norte. Composta por cerca de 600 a 800 membros, que vivem as margens do rio Catu. Foi nesta comunidade que foi implantada a primeira e única escola reconhecidamente indígena do estado, que apresenta um currículo diferenciado, objetivando a manutenção das tradições e costumes, incluindo aulas de tupi, esportes e religiosidades próprias da cultura.
O Diagnóstico Rural Participativo foi realizado na comunidade do Catu nos dias 29 e 30 de maio de 2018. A equipe formada pela pedagoga Kize Arachelli, a assistente social Izaura Sales, o técnico agrícola Sérgio Henrique e Renata Bezerra, engenheira de pesca, atuam como agentes mediadores da construção deste diagnóstico.
O DRP tem como princípios básicos o respeito à sabedoria e a cultura popular, escutando a todos da comunidade, analisando e entendendo as diferentes percepções apresentadas pelos envolvidos, e a análise é realizada na própria comunidade onde foi realizado o diagnóstico. Estes princípios coadunam com as práticas educativas de Freire, no sentido de compreender os sujeitos e propor a superação da contradição entre educador e educando. Para Freire, a educação libertadora tem uma proposta dialógica que considera que educadores e educandos desempenham ao mesmo tempo o papel de aprender e ensinar, considerando a dinâmica do processo formativo.
Durante o processo de DRP são construídos Mapas da comunidade, considerando recursos naturais e infraestrutura. Estes mapas são elaborados pelos próprios agricultores, que identificam as potencialidades e a estrutura disponível para o desenvolvimento da região. Esta metodologia busca a compreensão, as percepções e o saber popular, possibilitando aos sujeitos um processo de valorização que objetiva à autonomia.
Na construção dos Mapas, a metodologia considera que as percepções apresentadas pelos sujeitos são influenciadas pelo gênero dos participantes, desta forma, como estratégia para identificar todas as percepções, o grupo é dividido por gênero para que construam o mapa identificando a comunidade e o sem entorno. Segundo Freire não é papel do educador impor ao educando a sua visão de mundo, mas dialogar com ele sobre a sua visão.

Foto 03: Mapa da comunidade do Catu – elaborado pelo grupo masculino.

Fonte: Acervo EMATER/RN.


Foto 04: Mapa da comunidade do Catu – elaborado pelo grupo feminino.

Fonte: Acervo EMATER/RN.

Outra técnica utilizada neste processo é a Matriz de Hierarquização, onde os participantes elencam os problemas e definem coletivamente a prioridade na resolução. Este tipo de abordagem trabalha a autonomia e emancipação dos sujeitos, estimulando a reflexão e a transformação criadora para que o próprio grupo faça suas proposições e identifique as possibilidades que possuem. 
As atividades que compõem a elaboração do diagnóstico apresentam elementos que buscam o fortalecimento da comunidade. O processo de Diagnóstico é realizado para que as ações possam ser desenvolvidas, especialmente em relação aos conhecimentos técnicos relativos à agricultura e/ou suas atividades no meio rural, que serão repassados à comunidade através de oficinas, ciclos de palestras e demais atividades que possibilitem a comunidade envolvida o conhecimento. Assim, observa-se que este processo de construção coletiva possibilita que a equipe eleja os conceitos e saberes que sejam interessantes e aplicáveis na comunidade, além de possibilitar um maior envolvimento do grupo que construiu as ações de forma coletiva. 


Foto 05: Construção da Matriz de Hierarquização na comunidade do Catu.

Fonte: Acervo EMATER/RN.

Observa-se nesta metodologia o que Freire apresenta em relação a definição do conteúdo a ser trabalhado nas atividades pedagógicas. Para ele não é uma imposição, e sim a devolução organizada, sistematizada do que o grupo entregou de forma desestruturada. Este processo de construção do conteúdo acontece a partir da situação concreta, de reflexão, apresentadas pelos sujeitos. Freire aborda o universo temático e a definição dos temas geradores, que além da apreensão dialógica, traz também a tomada de consciência dos indivíduos, culminando na organização do conteúdo e da ação política. Segundo Freire, investigar o tema gerador é compreender o seu atuar sobre a realidade, que está diretamente ligado no caso do DRP a compreensão da comunidade em relação aos seus espaços, os seus recursos e potencialidades. 
Com base na experiência das ações desenvolvidas pela EMATER, podemos visualizar que o método apresentado por Freire não se emprega apenas no processo de alfabetização, apesar desta área ter sido mais conhecida e difundida, através de projetos desenvolvidos pelo próprio autor, como “As 40 horas de Angicos”, desenvolvido no município situado no Rio Grande do Norte que objetivou o processo de letramento e alfabetização.

Foto 06: Dinâmica de integração.

Fonte: Acervo EMATER/RN.

Para Freire a prática libertadora só é possível através do diálogo, pois sem comunicação, não há educação. Além disso Feire aponta a relação horizontal e o fluxo de conhecimento que ocorre entre educador-educando. Trabalhando a autonomia e emancipação, considerando que o processo educativo é inacabado, contínuo. São estas ideias e compreensões que norteiam o trabalho que a extensão rural desenvolve na EMATER, não apenas na fase da realização do DRP, mas também na implementação das ações que são realizadas a partir das informações e da construção coletiva realizada pela equipe e comunidade. O autor desenvolveu no seu legado muito conhecimento no que refere ao desenvolvimento rural e o fortalecimento dos sujeitos que integram o campo.

REFERÊNCIAS

FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. 64ed. Rio de Janeiro/ São Paulo: Paz e Terra, 2017.
_______, P. Extensão ou comunicação. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977. 93p. 
VERDEJO, M. E. Diagnóstico rural participativo: guia prático DRP. Brasilia: MDA/Secretaria de Agricultura Familiar, 2010.
KUMMER, L. Metodologia participativa no meio rural: uma visão interdisciplinar. Conceitos, ferramentas e vivências. Salvador: GTZ, 2007. 155p. 


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