Cefas Carvalho

01/05/2018 23h02
A tragédia do prédio que sofreu um incêndio e desabou no Centro de São Paulo cabe, além da comoção, muitas reflexões.
 
Quanto à comoção, ela é compreensível. A imagem de um edifício de 24 andares em chamas é pavorosa. Assistir á sua queda em meio ao trabalho dos bombeiros, idem.
 
Particularmente senti bastante a tragédia. Trabalhei perto daquela região, mais exatamente na Barão de Itapetininga, nos anos 90. Andei muito pelo trecho do Largo do Payssandu, local cheio de bares, lanchonetes e prédios históricos. Quando vou á São Paulo, me hospedo em um hotel a menos de dois quarteirões do local da tragédia.
 
Paralela à comoção, vem á reflexão sobre as famílias que ocupavam o prédio abandonado, antiga sede da Polícia Federal de SP. Eram famílias de pessoas Sem Teto, ou seja, que não tinham - e não têm - onde morar e por razões diversas não têm como morar na periferia paulistana.
 
A tragédia do déficit habitacional brasileiro é antiga. Foi minimizada com o programa Minha Casa, Minha Vida, mas continua sendo de extrema gravidade principalmente nos centros urbanos.
 
E além da gravidade, ganha conotação de ironia, farsa e revolta quando lembramos que a tragédia do prédio ocorre meses depois do esperneio dos juízes brasileiros pela manutenção do Auxílio-Moradia, um acinte legal na qual magistrados tem direito a mais de 4 mil reais para "terem condições de moradia digna". Os juízes que tem salários dez ou vinte vezes maiores que o salário-mínimo e a média do trabalhador brasileiro,
 
Pior: Muitos juízes simplesmente tem imóveis próprios na comarca onde trabalham, ou seja, não necessitam do auxílio e deveriam, eticamente, abdicar dele.
 
Pelo contrário, lutam pela manutenção do auxílio, que é legal, mas, é imoral.
 
Tão imoral quanto o ódio de internautas pelos ocupantes do prédio incendiado, que não são "vagabundos", como escreveram muitos deles, ou "criminosos", como definiu o ex-prefeito de SP, João Dória. São trabalhadores, pais e mãe de família que tiram seu sustento nas ruas do Centro de São Paulo. E que merecem respeito, além de moradia.
 
Em um país que paga a mais para juízes que têm imóveis.
 
Pobre Brasil de tantas contradições.
 

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