Daniel Costa

09/03/2018 09h51

Depois de rasgarem os códigos para proferirem decisões com base exclusivamente nas suas próprias convicções, os juízes dão um passo além na estrada da arbitrariedade e agora se acham prontos para jogar nesse caldo os advogados junto com as suas prerrogativas estabelecidas em lei. 

As notícias surgem pelos quatro cantos do país: escritórios de advocacia suportam buscas e apreensões desmotivadas; e advogados têm suas conversas com clientes interceptadas, ainda que o sigilo dessa relação seja garantido por lei. Sem meias palavras, o conteúdo do Estatuto da Advocacia vem sendo transformado num monturo. 

Alguém já disse, não sem razão, que nem nos tempos do regime militar se viu algo parecido. Podemos concordar. Mas também sejamos claros: essa prática é resultado de um estado de coisas que se instalou na nação com o apoio da própria Ordem dos Advogados do Brasil. 

Afinal de contas, não nos esqueçamos que a OAB, incluindo aí a Seccional do Rio Grande do Norte, apoiou explicitamente a destituição de Dilma Rousseff, mesmo sabendo que o impeachment da ex-presidenta se desenrolou à revelia da lei. Basta lembrar que as pedaladas fiscais, alçadas à condição de requisito suficiente para a configuração do crime de responsabilidade, era prática usual entre os chefes dos poderes executivos, existindo um entendimento consolidado no seio dos Tribunais de Contas, que emprestava licitude às ações desse naipe.   

Na época, porém, o argumento utilizado pelo presidente da ordem, Cláudio Lamachia, foi genuinamente ideológico: “o pedido de impeachment da OAB contra Dilma é pelo conjunto da obra”. 

A Ordem dos Advogados do Brasil achou, assim, que destronar uma presidente democraticamente eleita “pelo conjunto da obra”, mas sem substância legal, não era nada demais. Como também não achou nada demais quando o juiz Sérgio Moro determinou a condução coercitiva de Lula. Na ocasião, inclusive, Cláudio Lamachia preferiu partir para declarações vazias, dizendo, dentre outras coisas, que “a Constituição não exclui ninguém de ser investigado”. 

A OAB, aliás, também não achou absurdo quando os ex-presidentes da república tiveram os seus telefones grampeados; quando Temer teve diálogos gravados; ou quando foi divulgada a conversa de Lula com um de seus advogados. Nesse último caso, inclusive, a Diretoria Nacional preferiu fazer críticas não à ilegalidade das práticas do judiciário, mas ao próprio ex-presidente da república, argumentando que ele havia feito “referências desairosas, deselegantes e desrespeitosas à Ordem dos Advogados do Brasil (...)”. 

Por certo, a Ordem imaginou que esse cabedal de arbitrariedades, que ela ajudou a construir, não iria atingir os seus membros. Ledo engano. Os advogados agora caem diante dos tiros desferidos pelas armas forjadas com o apoio da própria entidade que os representa. As recentes palavras de inconformismo do presidente nacional, e de outros proeminentes advogados, assim, surgem em momento tardio, quando a juristocracia já está bem alojada. 
Todos falam em mudanças. A verdade sem roupa, entretanto, é que as coisas continuam como sempre, inclusive a OAB, que tal como aconteceu em 1964, cava a sua cova para depois se arrepender. 


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