Cefas Carvalho

26/02/2018 22h40
Revirar caixas, baús, papéis antigos, é ter a certeza de encontrar uma parte da história da gente, sejam bons ou maus momentos. Em recordando momentos ruins ou tristes, a solução mais simples é rasgar a lembrança de celulose ou papel fotográfico, deitar ao lixo mais próximo e pronto! Voltar à arqueologia das memórias.
 
Mas quando o achado lembra bons e intensos momentos, ah, neste caso um filme é exibido na memória e as sensações das coisas boas vividas retornam com a força de uma descarga elétrica.
 
E por falar em filme, foi o caso na noite desta feira, quando a procura de lebres acabei encontrando um leão, sentimentalmente falando. Um folder mimeografado da programação do Cineclube Oscarito, que ficava no Centro de São Paulo, mais exatamente na Praça Roosevelt (hoje totalmente repaginada) em junho de 1990. Época em que morei na Paulicéia Desvairada, em busca de independência e maturidade, dividindo uma quitinete na Rangel Pestana, no Brás, com os amigos Paulo de Tarso e Alan Capriles. 
 
Em um ano dos mais gelados na megalópole e devastado pela política econômica de Collor, pouco dinheiro, empregos precários, dificuldade em fazer novas amizades, uma das minhas tábuas de salvação, junto com os sebos da Sé, eram os cineclubes. Mais baratos que os cinemas tradicionais e com programação alternativa e clássica, funcionaram como terapia ocupacional, apoio emocional, influência estética, refúgio quando chovia, tudo, enfim. Dois principalmente, o Bijou, no Bixiga e o citado Oscarito, funcionavam como minhas segundas casas.
 
Neste período assisti meus primeiros Bergman, Antonioni, Truffaut e Glaúber Rocha, influências estéticas e sensoriais que trago até hoje. Descobri filmes russos, noruegueses, argentinos (bem antes de Ricardo Darín) e espanhóis. Assisti filmes trash que até hoje não sei se apreciei ou não. Revi clássicos pessoais meus, como "Veludo azul" e "Betty Blue". 
 
Os dois citados acima, inclusive, assisti naquele junho de 1990, estão ali na programação descoberta no folder improvisado. Nele, curtas sobre bandas de rock, um filme que jamais assisti, "Os crimes de Oscar Wilde", o "Imensidão azul", de Luc Besson, que eu só assistiria anos depois em VHS. Enfim, um painel do que rolava nos cineclubes naquele período e, mais que isso, um retrato do cinéfilo quando jovem.
 

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