Andrezza Tavares

22/11/2016 10h13
(em parceria com Dayvyd Lavaniery Marques de Medeiros)
 
Este texto é um recorte das discussões feitas na dissertação de mestrado defendida pelo professor do IFRN Dayvyd Lavaniery Marques de Medeiros e orientada pela Professora Dra. Andrezza Tavares e tem como principal finalidade refletir sobre as Políticas de Formação de Professores com vistas à Educação Profissional, concentrando-se nas relações ente as Licenciaturas oferecidas pelo IFRN- Campus natal Central e as ações do PIBID (Programa de Bolsas Institucionais de Iniciação à Docência), promovido pela coordenação de Pessoal de Nível Superior (CAPES) através do Ministério da Educação (MEC), enquanto uma política de incentivo a formação inicial e valorização dos profissionais do magistério no Brasil.
 
Tendo esse contexto de pesquisa como norteador, entendemos que engendrar-nos nas discussões acerca da formação de professores tendo como base uma dicotomia estabelecida entre uma formação liberal ou uma formação progressista é darmos continuidade a uma discussão que baseia o trabalho docente  numa realidade socialmente dicotômica e permeada por uma disputa de projetos societários distintos como estamos afirmando em nossas discussões até aqui.
 
DISCUTINDO OS CONTEXTOS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES
 
Seria muito simples se apenas atribuíssemos matematicamente um tipo de formação a um projeto societário distinto, mas talvez essa discussão nos fizesse distanciar da égide de um trabalho como o nosso que tenta problematizar essa relação numa perspectiva científica. Logo, precisamos pensar em parâmetros para iniciarmos nossas discussões acerca da formação de professores e sua natureza liberal ou progressista. 
 
Entende-se que a transformação acelerada das sociedades ao longo das últimas décadas criou novas expectativas em relação à escola e provocou fortes pressões nos sistemas educativos. Nesse contexto, ficou clara a influência capitalista no escopo das Reformas de todos os níveis de ensino. Como fato novo desse contexto, as Reformas providenciadas interpelaram, de forma afluente, os conteúdos e os dispositivos de formação docente (VEIGA, 2002; TAVARES, 2005).
 
Diante dessa evidencia, Silva (1997) afirma que ao lado do processo de mercantilização da educação, há uma forte pressão para que as escolas e as universidades se voltem para as necessidades estreitas da indústria e do comércio. Para esse autor, do ponto de vista dos liberais, a educação institucional existente é classificada como ineficiente, inadequada e anacrônica, em relação às exigências do trabalho nos setores da indústria, do comércio e dos serviços. 
 
Para os liberais, o ponto de referência para desaprovar a escola atual não é a dificuldade de se formar cidadãos atuantes, autônomos e críticos, ou a dificuldade de elevar-se o padrão cultural da população oprimida que sofre com as desigualdades existentes, mas as necessidades de competitividade e lucro das empresas. Como consequência, as soluções propostas pela visão empresarial tendem a amarrar a reestruturação do sistema educacional às estreitas necessidades de treinamento da indústria e do comércio. O esquema básico proposto é o da estreita preparação para o local de trabalho. Adotar uma perspectiva diferente não significa negar a importância da preparação para o trabalho, mas colocar essa preparação num quadro que leve em consideração principalmente às necessidades e interesses das pessoas e grupos envolvidos, sobretudo aqueles já prejudicados pelos presentes esquemas, e não as especificações e exigências do capital (KUENZER, 1998).
 
A nossa escolha por essa discussão dá-se porque queremos sugerir que a valorização do magistério por meio da formação profissional será, de fato, alcançada quando a política de formação docente do cenário nacional privilegiar: uma sólida formação inicial que mobilize a diversidade dos saberes (o saber da formação profissional, o disciplinar, o curricular e o experiencial), uma permanente formação continuada, uma contundente capacidade de pesquisa, boas condições de trabalho, melhorias salariais, melhorias institucionais e significativos planos de carreira, que envolve claramente melhores salários e condições dignas de trabalho.
 
Seria então importante, perceber que essa formação de professores está inserida numa realidade social que irá influenciá-la, logo, também impactará a trabalho docente do profissional egresso dela. Com isso, como já discutimos anteriormente, o docente trabalhará muito com sua experiência, agregando à sua prática, suas vivências (TARDIF, 2014). 
 
A hegemonia que o modo de produção capitalista imprime em nossa sociedade é notória e ela esta presente em todos os segmentos da sociedade e, na educação não seria diferente, ela serve, em muito como propagadora desses ideais hegemônicos e estão presentes nas políticas de formação inicial dos professores, impelindo-os a uma prática que esteja alinhada com esses conceitos.
 
Essa pedagogia do capital patrocina a exacerbação das desigualdades sociais econômicas e do individualismo, imprescindíveis, segundo sua lógica, ao aumento da competitividade, que por sua vez, é o motor da economia de mercado (MOURA, 2013). Ela serve como base a uma prática pedagógica chamada de liberal que idealiza a escola como preparadora dos indivíduos para o desempenho de papéis sociais, fazendo uso de suas aptidões e adaptação às normas vigentes na sociedade de classes através do desenvolvimento da cultura individual. Difunde-se a ideia de igualdade de oportunidades, embora não leve em conta a desigualdade de condições, Historicamente, a educação liberal iniciou-se com a pedagogia tradicional e, por razões de recomposição da hegemonia da burguesia, evoluiu para a pedagogia renovada, o que não significa a substituição de uma pela outra, pois ambas conviveram e convivem na prática escolar.
 
A partir dessa discussão, entendemos que a formação de um professor liberal é aquela provinda de uma política que atende aos interesses vigentes do modo de produção hegemônico e esse docente será uma peça importante na propagação e fortalecimento desse projeto societário, pois lançará mão de práticas que o fortaleçam. Em seu trabalho docente, serão comuns o incentivo da empregabilidade  e ao empreendedorismo  para fortalecer a manutenção de uma sociedade competitiva e desigual que subsidie o crescimento do capital.
 
Seria possível fugir dessa lógica formativa de docentes numa sociedade subsidiada pelos valores de um modo de produção hegemônico que impele o trabalho docente para suas engrenagens e o faz material de sua constituição? Nos parece que a única forma de que isso aconteça seria a consciência global desse docente de sua condição enquanto trabalhador e formador de outros trabalhadores. Isso, na verdade, basear-se-ia na condição utópica da formação de professores em nossa sociedade, visto que ela é coerente com a sociedade neoliberal, pois, afinal, essa sociedade se nutre da desigualdade ao mesmo tempo que a alimenta, já que essa é a substância vital da competitividade (MOURA, 2013).
 
Em oposição a esse projeto societário hegemônico que é permeado pela pedagogia capitalista, instrumento da prática de professores liberais formados à lógica do capital, existe um projeto societário contra-hegemônico, apoiado em uma visão cuja centralidade esteja nos homens e mulheres e em suas relações com a natureza e cuja meta seja alcançar a igualdade substantiva entre os seres humanos (MOURA, 2013).
 
É nessa perspectiva utópica, mas necessária, da contra-hegemonia que surge a base de uma pedagogia anti-capitalista, não sendo minimalista e buscando uma mera querela, mas tentando buscar meios de discuti-la. 
 
Uma pedagogia da autonomia já mencionada por Freire (2013) em sua obra, mas também da esperança, do trabalho, e, porque não tentarmos ampliar uma pedagogia da pessoa que forme os trabalhadores para uma postura crítica, consciente e global da sociedade em que estarão inseridos.
 
Nessa perspectiva, a formação de professores deve considerar elementos que constituam a compreensão de uma prática docente enquanto dimensão da formação humana (FREIRE, 2013). Teríamos então uma pedagogia que forma um professor progressista que, mesmo forjada na utopia, pode ser aplicada como contraposição ao que é proposto hegemonicamente pelo capital. Nela, o professor não pode negar-se o dever de, na sua prática docente, reforçar a capacidade crítica do educando, sua curiosidade, sua insubmissão (FREIRE, 2013).
 
Mesmo sabendo a força que o capital exerce sobre as políticas de formação de professores no intuito de propiciar em larga escala uma formação que atenda aos seus interesses é preciso que haja uma maior resistência nesses processos de formação que parecem inserir o docente em uma “máquina” de formar professores.
 
PALAVRAS FINAIS
 
Nossas reflexões em consonância com as reflexões de alguns pensadores da educação são de que essas políticas de formação de professores devem propiciar uma educação que seja concebida como uma prática social e um processo lógico de emancipação. O referencial para as propos¬tas de formação dos professores visa à construção coletiva de um projeto alternativo capaz de contribuir, cada vez mais, para o desenvolvimento de uma educação de qualidade para todos (FREITAS, 2002).
 
Parece-nos claro que é importante que a as políticas de Formação de Professores apontem para uma possibilidade de catalisação de uma formação docente progressista que se insira, numa sociedade dominada pelo modo capitalista que tende a instrumentalizar a formação docente como mera preparação para o mercado de trabalho, profissionais capazes de transformá-la em todos os âmbitos e que, conscientes de seu papel transformador formem os trabalhadores para a autonomia. 
 
A Educação, quando a entendemos como uma prática social de amplitude eminentemente humana tem a necessidade de fazer a diferença numa sociedade de diversidades cada vez mais delineadas. Nessa linha de raciocínio, entendemos que a prática dos professores constituída também no seu trabalho docente, com a abrangência que esse termo tem, deve constituir-se da mediação entre essas diversidades sociais e os diferentes saberes do professor para que ocorra uma superação da fragmentação do ensino como reprodutor de meras informações e para a transformação social. No momento em que vivemos, a educação, baseada nas práticas de um professor progressista, precisa ter um sentido de superar o que está posto na lógica liberal proposta pelo capital.
 
Pensamos que isso possa acontecer tanto num programa fortalecedor da Formação de Professores, que é o PIBID, como na própria concepção dos currículos e da prescrição normativa interna dos Institutos Federais que versam sobre as licenciaturas, quanto no próprio conceito de Formação Profissional Docente, que a literatura científica aborda, quanto na concepção geral das Políticas públicas de Formação de Professores.
 
REFERÊNCIAS
 
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo-SP: Ed. Paz e Terra, 2013
 
IMBERNÓN, Francisco. Formação docente e profissional: formar-se para a mudança e a incerteza. 9º ed. SP: Cortês, 2011.
 
KUENZER, Acacia Zeneida. A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NOS ANOS: A DIMENSÃO SUBORDINADA DAS POLÍTICAS DE INCLUSÃO. Educação e Sociedade, Campinas, v. 27, n. 96, p.877-910, out. 2006. Quadrimestral. Disponível em: . Acesso em: 29 out. 2014.
 
MEDEIROS, Dayvyd Lavaniery Marques de.  Políticas de formação inicial de professores com vistas à educação profissional : um estudo sobre as licenciaturas e o PIBID oferecidos pelo IFRN-CNAT. Dissertação (Mestrado em Educação Profissional) – Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte. Programa de Pós-Graduação em Educação Profissional, 2016.
 
MOURA, Dante Henrique. Algumas possibilidades de organização do ensino médio a partir de uma base unitária: trabalho, ciência, tecnologia e cultura. In: SEMINÁRIO NACIONAL: CURRÍCULO EM MOVIMENTO – PERSPECTIVAS ATUAIS, 1., 2010. Anais... Belo Horizonte, 2010.
 
TAVARES, Andrezza M. B. do N. as transformações do mundo do trabalho e os impactos no campo da formação de professores no Brasil. Congresso Internacional de Formação continuada e profissionalização docente, 1., 2005, Natal, RN: [s.n]. Anais... 2005. p.19-21. 
 
VIEIRA, Sofia Lerche. Políticas de formação em cenários de reforma. In:  VEIGA, Ilma Passos A. (Org.). Formação de professores: políticas e debates. Campinas, SP: Papirus, 2002

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