Andrezza Tavares

21/10/2016 16h35
 
 
As concepções de currículo escolar podem ser analisadas e discutidas a partir de três tipos de abordagem: tradicionais/conservadoras, críticas e pós-crítica. De maneira geral, as vertentes que discutem conceitos e abordagens de currículos tiveram origem nos Estados Unidos e na Inglaterra, influenciando o pensamento escolar do ocidente, destacadamente o cenário Brasileiro.
 
As influências das correntes de pensamento que orientaram a configuração do ensino e precisamente do currículo têm origem no começo dos tempos modernos, na Europa. 
 
A escola elementar surgiu para atender, sobretudo, as necessidades da nascente burguesia urbana que se constituía naquele momento. O discurso e a construção das diversas propostas de currículo escolar no Brasil não se deu sob uma única ideologia, mas com influência de tendências, objetivos e interesses apontados nos diferentes contextos da histórico do Brasil. 
 
A palavra currículo, de origem latina, regressou à nossa linguística por mediação anglo-saxônica. Vem do latim curriculum e significa “pista de corrida”. Podemos dizer que, no curso desta “corrida”, por meio da trajetória escolar, acabamos por receber muita influencia para nos tornar quem somos. Um currículo não surge do nada, mas de intencionalidades, fruto de necessidades social, econômica, científica, tecnológica, entre outras.
 
 
As concepções de currículo escolares expressam visões, crenças e interesses, pois estas se constituem por meio de processos intencionais que envolvem pessoas conceptoras. Esse processo, pela sua própria natureza do desenvolvimento curricular não pode ser negligenciado que é caracterizado tanto pelo processo interpessoal (vários autores) quanto pelo processo político (tomada de decisões) das organizações.
 
A discussão sobre currículo escolar vem assumindo importância e ocupando cada vez mais, espaço no campo das pesquisas em educação no Brasil. 
 
Associada a esta centralidade, identificamos uma multiplicidade cada vez mais crescente de referências teóricas que dialogam sobre esse campo curricular.
Discutir currículo significa discutir a própria educação formal*, pois diante de qualquer aspecto que se queira abordar na área, seja a política curricular, a prática pedagógica, as representações sobre diversos elementos, as questões das diversidades, a organização escolar, dentre outros, não há como negar a eminência de um campo de estudos que se dedica a compreender os movimentos de construção da escolarização e seus significados.
 
No ultimo mês de outro do ano de 2016, a sociedade brasileira foi apresentada a uma nova configuração de ensino médio por meio da Medida Provisória 746/2016 que propõe consubstanciais mudanças para o ensino médio enquanto política educacional. É preciso se construir uma reflexão crítica sobre essa nova prescrição normativa pensada para o ensino médio brasileiro que coloca a reestruturação curricular no centro dos debates. 
 
Repensar o currículo e a sua expressividade em uma sociedade que clama por aprendizagens significativas, implica acima de tudo, repensar alguns pressupostos que norteiam a sociedade da informação, do conhecimento e das aprendizagens. Nesse contexto, impõe-se romper com a concepção do currículo isolado, descontextualizado, fragmentado que não propicia a construção e a compressão de nexos que permitam a sua estruturação com base na realidade. 
A concepção crítica do currículo nos convida a pensa-lo em um contexto histórico e político, na perspectiva da totalidade e da omnilateralidade**.
 
Esse é um convite para entender essa estrutura escolar em uma visão mais humanista, em que se percebe o homem de maneira ontológica, capaz de realizar os processos de organização, construção e transformação da sociedade.
 
O Currículo que sugere a formação humana difere de um currículo derivado de concepções pedagógicas tradicionais. É importante ressaltar que em qualquer conceituação de currículo, está em evidencia algum tipo de poder, pois não existe neutralidade no currículo, ele é veículo de ideologia, da filosofia e da intencionalidade educacional. 
 
Para Sacristán (2000), referencial seguro da concepção crítica do currículo escolar: o currículo é uma práxis antes que um objeto estático emanado de um modelo coerente de pensar a educação ou as aprendizagens necessárias das crianças e dos jovens, que tampouco se esgota na parte explicita do projeto de socialização cultural nas escolas. É uma prática, expressão, da função socializadora e cultural que determinada instituição tem, que reagrupa em torno dele uma série de subsistemas ou práticas diversas, entre as quais se encontra a prática pedagógica desenvolvida em instituições escolares que comumente chamamos de ensino. O currículo é uma prática na qual se estabelece diálogo, por assim dizer, entre agentes sociais, elementos técnicos, alunos que reagem frente a ele, professorem que o modelam.
 
É justamente na construção ou na elaboração dos modelos e das propostas curriculares, que se define que tipo de sociedade e de cidadão se quer construir, o que a escola faz para quem faz ou deixa de fazer. É também na construção ou definição dessas propostas, que são selecionados conteúdos, que vão ajudar as pessoas a entenderem melhor a sua história e a compreenderem o mundo que as cercam.
 
Os elementos reflexivos na presente coluna são fundantes para a compreensão crítica da Medida Provisória 746/2016. Esse é um de nossos interesses de investigação atualmente, pois trata-se de uma nova contingência que, se aprovada pelos parlamentares, condicionará o ensino médio da escola pública brasileira.
 
*Chama-se educação formal a que é ministrada formando parte do sistema de educação oficialmente reconhecido, com estrutura e organização aprovada pelos organismos competentes e cujos produtos (aprendizagem ou desempenhos alcançados pelo aluno) são verificados por meio de avaliação e legitimados por diplomas ou certificados.
 
**O conceito de ominilateralidade, embora não haja em Marx uma definição precisa é verdade que o autor a elase refere sempre como a ruptura com o homem limitado da sociedade capitalista. Uma formação humana oposta à unilateral provocada pelo trabalho alienado.  Disponível em: http://www.dicionarioinformal.com.br/omnilateralidade/aacessado em 18 de agosto de 2014.
 
Andrezza Tavares é Doutora em Educação (UFRN/2010)​, professora dos cursos de Graduação e dos Programas de Pós-Graduação do IFRN e Coordenadora Institucional do PIBID/IFRN/2013. Facebook/andrezza.tavares.391 / Instagram:@prof.andrezzatavares
 

 


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