Daniel Costa

24/06/2016 07h37
Esta semana foi de doer. Já na segunda tive que interromper o trabalho diante da notícia de que a mãe de um colega falecera. Tenho pavor de velórios. Mas quem não tem?  O problema é que não dava para deixa de ir. Não era a mãe de um colega qualquer, era a mãe de um amigo do bar. Todos os camaradas de balcão se uniram para ir prestar condolências e eu também me senti na obrigação de comparecer.  
 
Incrível o desenrolar da sociedade de hoje. A mãe do sujeito morre e os amigos que correm para abraçá-lo não são os colegas de infância, do colégio ou do trabalho. São os amigos formados na mesa de um bar, entre goles de cerveja e papos sobre Beatles, Rolling Stones, Zico e Maradona. Isso me parece uma coisa surpreendente, boa mesmo, e não há nenhuma crítica ou ironia nessa afirmação. É que para a geração anterior, dos meus pais, amigos e mesa de bar eram coisas completamente antagônicas. Bar era apenas um lugarzinho sórdido, frequentado por notívagos vagabundos e viciados. Hoje, parece mesmo que o troço mudou. Irmãos e parentes se peitam por conta de uma herança de dez mil réis, en-quanto os colegas de bar lutam para que o amigo herdeiro deixe de lado a tristeza e vá ser feliz com o que der e vier.  
 
Lá no bar que eu frequento há um grupinho de pessoas realmente distintas. Homens e mulheres com concepções de vida até que diferentes, mas que se conectaram para formar uma turma tipo a de colé-gio, que sobrevive por muitos anos, só que sem as chatices das provas e dos professores. 
 
Essa turma já pulou carnaval, troçou no halloween, realizou churrascos e um montão de festas mais. Já curtiu viagens e ressacas amorosas. Já discutiu sobre política, falou de cinema, de música e de literatura. Inventou um blog e um bloco com marchinha e estandarte, e se autodenominou "A turma da diretoria". Teve gente que arranjou namorado. Dois ou três noivaram e até casaram. Alguns foram embora. Outros tantos chegaram. A turma também chorou com os divórcios e com as derrocadas da vida. Mas também vibrou diante das alegrias. Eu mesmo corri para o bar quando a minha filha nasceu. Os meus amigos estavam por lá me esperando com um legítimo e delicioso Cohiba. E quando levei rasteira numa prova foi um amigo do bar que veio me dar uma boa traulitada na cabeça: "tá estudando pouco, vagabundo!".  A gente acaba torcendo para que a vida de cada um dê certo, para que os negócios vigorem, para que todos sejam felizes e que as amarguras dá existência su-mam. 
 
A segunda-feira foi um dia de lascar, triste mesmo. Mas a turma do bar vestiu a melhor cara, deixou os seus afazeres e tomou rumo para o velório. A cerveja, a música e a filosofia ficaram de lado. "Meus pêsames. Bola pra frente". Afinal, a amizade calhou de nascer numa mesa de bar. Mas hoje são todos caros amigos. 
 

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