Cefas Carvalho

04/05/2016 11h11
Em meio a este momento histórico esquisito que vivemos no Brasil, com polarização de péssima qualidade, política ganhando status de paixão futebolística e gente que acha que não existe um golpe, ainda que constitucional, em curso, me espanta ainda a indignação seletiva.
 
Passei o fim de semana observando muita gente reclamar que a presidenta Dilma Rousseff irá aumentar o valor de repasse do Bolsa-Família (em média 9%). Alguns repetindo aquele mantra quase nazista de que "isso é para sustentar vagabundo" ou "agora as mulheres vão fazer mais filhos para receber mais dinheiro".
 
Assusta-me ver amigos condenando com tanta veemencia um benefício médio de R$ 77,00 por mês, que chega no máximo a  R$ 336,00. E se você acredita naqueles boatos de que fulano recebe dois mil reais do Bolsa-Familia e em "auxilio-reclusão" para presos ficarem numa boa, então pare de ler esse texto e volte para o mundo da boataria de rede social que, claro, sempre arrebenta para o lado mais fraco.
 
Gente comentando que aumentar um programa como o Bolsa-Familia faz parte de um "pacote de maldades" para Temer herdar não apenas beira o ridículo, mas, a insanidade. Seja porque a pessoa desmerece quem recebe o benefício, seja porque compactua com um presidente que, em assumindo, o fará sem qualquer legitimidade (nem voto).
 
Na mesma semana, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) regulamentou pagamento de auxílio-moradia a todos os juízes do país e fixou em R$ 4.377,73 o valor do benefício para os magistrados – o mesmo previsto para ministros do Supremo Tribunal Federal(STF).
 
Por decisão liminar do ministro Luiz Fux, da Suprema Corte, todos os juízes federais, estaduais, da Justiça do Trabalho e da Justiça Militar passaram a ter a prerrogativa de receber o auxílio-moradia.
 
Você não leu errado. E esse dinheiro a mais será até para juízes que possuem residência própria e para aqueles que atuam em suas cidades de origem. Ou seja, vão ganhar 4 mil de auxilio-moradia mesmo tendo imóvel na cidade onde trabalham.
 
Os amigos indignados com o Bolsa-Família pouco ou nada se indignam com um escândalo desses. Talvez seja mais fácil espernear contra quem luta pelo pão nosso de cada dia do que contra os magistrados togados, de sobrenomes diferentes e que falam bonito.
 
Freud talvez explique: quem sabe boa parte dessa classe média onde gravitam tantos amigos e amigas citados/as se ache mais próximo do juiz do que do agricultor? Portanto, a crítica é feita a quem está distante, quase em um mundo à parte, e não a quem vive em um universo onde ele sonha em estar e torce para que os filhos cheguem lá.
 
Mas, claro, não justifica a seletividade na indignação. Boa hora, com esse benefício do judiciário somado ao aumento da categoria aprovado pela Câmara (sim, aquela comandada por Eduardo Cunha, réu no STF e envolvido em 11 de cada 10 listas de escândalo) de refletir sobre essas indignações seletivas. Deus está vendo, viu?   
 

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